Quando se constata o número de crentes que participa nos actos litúrgicos semanais, é notória a sua diminuição. Estudos regionais e nacionais assim o comprovam.
As igrejas são menos frequentadas, sobretudo pelos mais jovens e o número dos que se dizem “não praticantes” é cada vez maior.
De acordo com o recenseamento da prática religiosa, realizado pelo Patriarcado de Lisboa, têm diminuído o número de lugares de culto e de celebrações dominicais, a que certamente não será alheia a diminuição do número de sacerdotes.
A investigação recente no domínio da sociologia da religião, fez emergir um novo tipo de prática religiosa, designada por Danièle Hervieu-Léger de “religiosidade peregrina”, a que correspondem práticas individuais, voluntárias, móveis, não condicionadas por esquemas tradicionais e formais que escapam a um recenseamento que se baseie na frequência dos actos litúrgicos.
Apesar da profunda alteração no modo como hoje se vive a religiosidade, não podemos negar a importância que têm os templos como lugares de culto e espaços sagrados, que estruturam os territórios.
Desde os primórdios do povoamento destas ilhas, que as igrejas se constituíram como centralidades, elementos determinantes na definição do crescimento das localidades, fazendo coincidir o limite da freguesia ao da paróquia. O lugar da igreja é determinante na geografia do tecido urbano e está culturalmente associado ao espaço da festa, onde a população se reúne para celebrar o patrono ou por ocasião de momentos decisivos na vida das famílias, como são os baptizados, casamentos e funerais.
A igreja representa o lugar sagrado, sinal de protecção e devoção, cuja construção se confunde com a história, quantas vezes lendária, de uma determinada comunidade. Uma ermida é mandada construir em cumprimento de uma promessa; uma igreja levantada por iniciativa de um rei com uma devoção particular; outra ainda construída no lugar onde, reza a história, ocorreu um milagre.
A destruição ou o abandono de uma igreja é sempre vivido como sinal da morte da própria comunidade. Por isso, sempre que isso acontece, particularmente na nossa Região, seja na sequência de um sismo ou porque se tornou visível a degradação do templo, as comunidades açorianas envolvem-se e participam na recolha de fundos, mobilizando a solidariedade dos paroquianos, residentes locais ou até emigrados. Todos se sentem envolvidos, porque a igreja da sua paróquia é a referência identitária que melhor unifica a comunidade local dispersa.
Recentemente foi notícia a construção de uma nova igreja em Ponta Delgada, há muito sonhada e desejada pela comunidade local e que, durante décadas, mobilizou a angariação de fundos. É desse sonho, da generosidade e do esforço de muitos, que nasce o templo dedicado a Nossa Sra. de Fátima na zona do Lajedo, servindo aqueles que moram mais afastados do centro da paróquia.
Apesar dos muitos contributos anónimos, foi necessário, à semelhança de outras (re)construções, o apoio de entidades públicas e privadas para concretizar a obra da nova igreja. No entanto, quem por último contribuiu não é mais importante do que o primeiro, esse alguém que um dia sonhou a construção de mais este templo católico, lugar onde a fé se transforma em rituais e os crentes em fiéis.
Como outras igrejas, construídas no tempo dos reis ou mais recentemente, este novo espaço sagrado é do povo e nunca pertença dos seus benfeitores, tenham eles contribuído com muito ou com pouco, no princípio ou no fim da concretização da obra, como anónimos ou entidades públicas e privadas.
Um novo lugar de oração irá abrir portas ao serviço da comunidade, a quem cabe dar-lhe vida, celebrando a partilha e a oração. Um espaço de referência onde o silêncio pode ser adoração, e a força o fruto da meditação.
Os templos, particularmente as igrejas católicas, apesar de cada vez menos frequentados pelos crentes, são dos poucos lugares onde se entra livremente, sem pagar, e se usufrui de um espaço que convida ao encontro, para alguns com Deus e para muitos consigo mesmos.
(Publicado no Açoriano Oriental de 23 de Março 2009)