A descoberta do genoma humano revelou uma matriz comum da humanidade e em nenhuma das suas componentes foi encontrada uma causa directa para a diferenciação do que designamos por raças.
Na realidade, os fenotipos ou traços físicos, como são, por exemplo, a cor da pele, o formato do rosto, a estatura, o tipo de cabelo, não são estruturantes do ser humano mas o resultado de um longo processo, de milhões de anos, de adaptação ao meio.
O que nos distingue, enquanto pessoas, comunidades, são os percursos de vida, o contexto étnico, social, económico ou outro, que nos identificam. São as línguas que não partilhamos, os costumes ou as tradições que nos enraízam numa comunidade ou os artefactos que nos habituamos a ver como parte do universo construído que nos rodeia.
O que nos distingue nunca nos deveria separar.
Infelizmente, evitamos os deficientes, recusamos a partilha com quem não compreendemos e resistimos perante a integração da diversidade na escola ou no bairro onde moramos. Como se a diferença estivesse no outro e não na relação que com ele se estabelece. Como se o problema do surdo fosse dele e não dos ouvintes que não falam a língua gestual ou o isolamento dos deficientes motores não estivesse relacionado com as barreiras arquitectónicas que alguns municípios teimam em não alterar.
Levamos séculos, julgando que o mundo acabava no horizonte do mar.
Só quando os navegadores trouxeram objectos e o testemunho de que havia mais mundos, tomamos consciência de que existiam outros povos, que alguns se apressaram em considerar inferiores, primitivos.
Passados tantos anos, as comunidades do ocidente são tudo menos homogéneas. A diferença não vem de fora, mas estrutura as cidades, as famílias, o mundo do trabalho e as escolas. As línguas são hoje partilhadas e o mundo perdeu as suas fronteiras na internet.
A cidadania implica reconhecer a diversidade, não como um problema mas uma fonte de enriquecimento, que alarga as fronteiras do conhecimento e relativiza a normalidade que alguns julgam ser ou representar.
Afinal não são os outros que são diferentes, mas o modo como os tratamos.
Porque a diferença, quando isola ou discrimina, somos nós que a fazemos.
(publicado no Açoriano Oriental, 16 de Novembro 2009)