Novos excluídos
A exclusão social ganha novos contornos na educação, protagonizada por medidas que evitam as diferenças culturais, de classe, de recursos e pretendem construir pequenos mundos de elite, onde só há lugar para os filhos de famílias que se conhecem, entre as quais se esperam alianças, casamentos e até negócios.
Sob a capa de medidas que visam a excelência e o rigor, aumentam a exclusão dos mais frágeis ou carenciados. Pretendem separar as crianças em função do grau de dificuldades, de deficiência, do bairro onde residem ou dos benefícios sociais que recebem. É a cultura de mérito, dizem os defensores desta discriminação.
Mérito? Com base em que critérios? Ter livros em casa, um computador pessoal, pais licenciados que, se não sabem explicar, pagam a quem o faça? Mérito conquistado num meio favorável, onde não faltam aulas de piano, de ballet ou violão, judo e onde há sempre verba para comprar material didático, desportivo e outros equipamentos, preferencialmente de marca?
Quando um ministro da educação retoma a velha máxima de que as escolas públicas devem separar os bons alunos dos que não têm resultados favoráveis, retoma a velha divisão social de classes, que indiretamente está associada a essas performances. Porque, não podemos esquecer que os contextos culturais mais favorecidos influenciam, de forma direta, os bons resultados dos alunos, e justificam aquilo que o sistema apelida de “mérito”.
Depois de se ter lutado por uma escola inclusiva, que não discrimine os deficientes, mas antes promova a solidariedade e uma educação para todos, eis que o ministro Nuno Crato retoma a ideia das turmas especiais para meninos especiais, reforçando a exclusão. Quem sabe, prossegue a máxima de que “longe da vista, longe do coração”, consequência direta da discriminação. Afasta do coração, dos afetos, aqueles que são excluídos da cidadania, considerados menores, menos capazes, com menos direitos, demasiado diferentes.
Esta nova forma de excluir é subtil, não põe letreiros, mas dificulta a o acesso, não proíbe, mas cria obstáculos, não é oficial mas acaba por penetrar o
pensamento de uma minoria instalada, com poder. Uma minoria que se julga superior e que, por isso, despreza, explora e até ridiculariza quem não pertence ao meio onde vive.
Nesta visão elitista, não há lugar para a diferença e muito menos para o multiculturalismo.
Em tempo de crise, quando faltam empregos e as dificuldades aumentam, há que estar vigilante, porque se corre o risco de ver intensificar a intolerância perante os imigrantes, os repatriados, os deficientes ou simplesmente os cidadãos que residem em zonas socialmente desfavorecidas.
O que pretende o atual governo da república para a educação é um retrocesso. Sob a capa de promover o mérito, quer igualar o que é diferente, obrigando alunos que foram alvo de currículos adaptados à realização de exames gerais, como se a uniformização fosse um critério de justiça. Recuperam o exame do 4º ano, introduzindo um travão ao processo educativo, num país que mal conseguiu generalizar a escolaridade obrigatória de nove anos e que assim, se isola ainda mais no contexto europeu.
O que pretende este governo do PSD/CDS? Reconstruir velhas fronteiras, entre ricos e pobres, entre filhos de família e os outros, sem nome?
Quem defende uma sociedade inclusiva, justa, não pode admitir que, a cobro da promoção do mérito, se agravem desigualdades sociais e se criem novos excluídos.
(publicado no Açoriano Oriental de 2 Abril 2012)