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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

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Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

A força do Espirito Santo

A palavra "força" faz pensar em cabos que seguram, braços que levantam pesos ou suportam no trapézio os movimentos de quem se balança confiante. Força física que a idade vai retirando, mas que nunca nos deixa de surpreender nessas e em outras circunstâncias em que o ser humano se agiganta em manifestações de resistência.

Como conseguem, como é possível? Certamente com muito treino, dirão uns, ou com muito exercício, dizem outros. Não será só isso! São humanos e os músculos ou os tendões tem limites na resistência. Então onde vão estes heróis buscar a força que os torna tão resistentes?

Há certamente uma outra força, que não apenas física, que pode explicar tanta tenacidade. Uma tenacidade que é também vontade, motivação.

Não vou desistir! Não será uma situação destas que me vai derrubar! Não lhe faço a vontade e ceder naquilo que considero importante.

Estas são algumas das frases que podemos ouvir de quem é forte, sem que isso signifique forçosamente demonstrações de capacidade para levantar pesos ou aguentar cargas pesadas.

Quem não desiste e se mantém firme tem força de vontade, uma energia anímica que pode mover montanhas e transformar as fragilidades em capacidades.

Dimensão interior ou espiritual, esta força confere coragem aos lutadores e trava a vontade de desistir ou abandonar o que com dificuldade queremos construir.

A força espiritual dá aos tristes razões para não se entregarem sem lutar. É uma fonte de energia e vigor que pode ser avaliada pelo esforço diário, que tantos colocam na luta contra as adversidades e os contratempos.

Podemos até não ser capazes de levantar pesos e sentir que o corpo já não responde às exigências do dia a dia, mas isso não implica que tenhamos perdido a força para vencer, a capacidade para continuar a encontrar sentido na vida. Algumas dessas pessoas, mesmo sofrendo ou vivendo em dificuldade, são capazes de animar os outros que parecem ter perdido o interesse por viver.

Talvez seja por ser energia e motivação na dificuldade, que o Espírito Santo, símbolo da força e da presença do divino na terra, ganhou um lugar especial na religiosidade insular.

Símbolo da transcendência e do poder, força na adversidade e luz na dificuldade, há muito que o culto ao Divino ocupa um lugar especial na vida dos açorianos nas ilhas ou na diáspora. Um culto que se manifesta em oferendas, solidariedade e fartura partilhada.

O Espírito Santo ocupa um lugar no coração dos açorianos porque representa a família, a união de todos, a partilha e o apoio nas horas difíceis, elementos fundamentais na construção de uma comunidade.

Desde que tocaram estas ilhas, os portugueses aprenderam a descobrir as virtudes da partilha e da união e tornaram tradição regional o culto atribuído à Rainha Santa Isabel, também presente em Tomar, onde se destaca o cortejo de oferendas de pão.

A força espiritual é anímica e nesse tempo, como hoje, representa a capacidade para não baixar os braços. Basta pensar no que seriam as ilhas no século XV para imaginar que não devem ter faltado ocasiões de grande desespero onde só apeteceria largar tudo e partir. Mas a luta falou mais alto e da braveza de uma vegetação abundante, os povoadores fizeram campos de produção, domesticaram o caráter selvagem de muitos animais e transformaram paisagens inóspitas em lugares habitados.

Ser açoriano é reconhecer neste ponto minúsculo do mapa mundo, uma referência identitária, que ainda agora depende da força de vontade de quem o habita.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 17 Maio 2016)

 

 

Capítulos da vida

A maioria de nós não é escritor ou romancista, nunca publicou uma novela e não sabe como se escreve um enredo. Mas, apesar disso, a vida de cada um de nós é uma história única, cheia de peripécias, recheada de momentos dramáticos, uns tristes, outros mais alegres. São inúmeros os acontecimentos, encontros e  desencontros que podíamos contar. Por isso, quando ouvimos a história de alguém é como se folheássemos um livro apaixonante, um romance que não queremos acabar de ler.

Mas, há um dia em que a história de alguém, que conhecíamos de perto, termina. Cala-se para sempre o texto que, sem nos darmos conta, estava na conclusão. Nessa hora sentimos que se fechou um livro, foi posto um ponto final numa narrativa, onde também nós éramos personagens.

Mesmo reconhecendo que aquela história teria de chegar ao fim, há uma enorme tristeza quando somos confrontados com a página em branco que encerra o último capítulo. Sabíamos que podia terminar, mas ficamos sempre à espera de partilhar mais umas páginas ou pelo menos ler mais algumas linhas.

A história da vida não tem o número de páginas que se quer, mas aquelas que correspondem à missão de cada um.

E é um facto, que fechar o livro da vida de alguém, com quem nos habituamos a viver e que fomos aprendendo a conhecer, é sempre encerrar um capítulo da nossa própria vida.

São etapas, capítulos que terminam que fazem recordar o passado e relembrar o essencial de tantas memórias.

Quando mais nada há para dizer, recorre-se à expressão, "É a vida!", frase feita que nos relembra que é o fim do último capítulo. Resta virar a página e recomeçar, desta vez sem todos os personagens que faziam a história, mas retomando as referencias que ficaram da sua passagem. Não esquecemos que partilhamos com eles vários dos nossos capítulos e também com eles aprendemos a ser quem somos.

Capítulos da vida são etapas que se sucedem, umas mais ou menos longas, mas sempre encadeadas num mesmo fio condutor. Aos poucos a história ganha sentido e tudo se encaixa como se tivesse sido planeado.

A vida vai fluindo e aqueles com quem nos cruzamos vão entrando e saindo nessa história, deixando marcas e memórias indeléveis.

Recordo a persistência no trabalho e o carinho pela terra, a arte de cuidar da vinha e a alquimia do vinho, um néctar que fazia da adega lá de casa um lugar de romaria.

Recordo a sinceridade no elogio e o silêncio no desagrado. Nunca passava sem a sesta a meio da jornada de trabalho e o gosto de voltar a casa, cansado depois de labutar. No final, quando as forças falharam, ficou o silêncio da aceitação, a ternura de um último olhar e a despedida tranquila de quem escolheu o momento para nos deixar.

Foi um livro que se fechou, mas não foi uma história escrita em vão. Das páginas que pude ler, ficaram lições de sabedoria, exemplo de uma história feita de renúncias e vitórias, uma vida de humildade e tenacidade de quem sabia o que queria, sem se revoltar, de quem sonhava mas era capaz de abdicar.

A vida é feita de capítulos, que nunca se repetem. E todas as páginas contam nessa história, que não conhecemos como nem quando termina.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 4 Maio 2016)

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