A Marcha é linda
Mais uma vez, a Marcha dos Coriscos desceu a Sé nas festas de São João.
Alguns dirão, mas qual o interesse? O que motiva tanto entusiasmo?
As marchas são antes de mais pessoas que se juntam com um propósito comum, o de aprender uma letra, uma música e saber coordenar tudo isso com uma coreografia, mais ou menos simples, que transmita emoção e dê uma imagem de conjunto.
Ao mesmo tempo que o grupo aprende estes passos, convive, partilha experiências pessoais e, a pretexto desta atividade, organiza eventos, junta os amigos e convive de forma intensa durante algumas semanas.
Não é fácil alinhar noventa pessoas e fazê-las marchar de forma acertada. Há sempre falhas, distrações e muitas gargalhadas. Mas ao fim de dois meses, todos aprenderam e, quando chega o dia do desfile, gera-se uma corrente de emoções porque, mais do que cada um, é a marcha que se apresenta e que importa valorizar.
Há em toda esta experiência, um espírito de cidadania que envolve a participação voluntária das pessoas e este exercício é que constrói o grupo, a marcha, e promove a boa disposição entre os marchantes.
É preciso dar espaço à alegria e ao convívio. São precisas pessoas em todo o tipo de movimentos cívicos, incluindo os que recuperam ou transmitem o espírito alegre das pessoas. Seja a cantar ou a dançar, num coro ou num grupo folclórico, numa marcha ou num desfile, é muito importante estimular essa forma livre e descontraída de estar em grupo.
O canto e a dança são formas de comunicação que fazem grupo, unindo as pessoas promovem um sentir comum. Longe das manifestações simétricas dos desfiles militares, onde todos se movimentam de forma completamente idêntica, ou quase, as marchas, as danças tradicionais estimulam a participação individual, sem que isso afete o coletivo. Cada um coloca um pouco de si, da sua alegria, e liberta emoções que depois se juntam às dos outros fazendo corpo, criando grupo.
Um grupo é sempre mais do que a soma dos seus membros.
E é muito importante que aprendamos e, sobretudo, ensinemos os mais novos, a saberem estar em grupo. É fundamental educar, desde o berço, dando valor às emoções, que são cimento nas relações e um barómetro que nos permite avaliar se estamos ou não atentos aos outros, se construímos comunidade ou vivemos centrados no nosso próprio umbigo.
Há cada vez mais individualismo nas relações sociais e, infelizmente, esse "vírus" manifesta-se em meninos e meninas, nos bancos dos jardins de infância, que não sabem estar com os outros, são agressivos e incapazes de brincar e partilhar uma bola no recreio. Sossegam quando estão diante de um écran, seja do tablet ou do computador, jogando com companheiros virtuais, o que parece agradar a alguns pais, desatentos de uma educação que ensine a estar em grupo.
A marcha é linda! Linda! Viva a marcha e o São João! Alegres Sanjoaninas, que aquecem o coração. A marcha é linda! Linda! Viva a Festa, vamos brindar, ao povo açoriano que une ilhes com o mar.
Este foi o refrão da Marcha dos Coriscos 2016, um hino à união de todos os açorianos que são capazes de viver separados pelo mar, mas que tem um coração único, onde não há sotaques ou diferenças, porque é o coração de um povo.
Viver esta experiência, de união e de partilha, gera uma grande alegria e boa disposição. E precisamos disso, "como pão para a boca"! Motivos para enfiarmos a cabeça na areia, não faltam! Dificuldades quotidianas, é o que mais há! Temos mesmo é de acreditar que somos capazes de "fazer pontes no oceano" e vencer as tempestades, com força de vontade e sentido de grupo.
(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 28 Junho 2016)