À minha porta, não!
Somos todos sensíveis perante situações de pobreza, droga, alcoolismo ou criminalidade. São tema de conversa de café as notícias sobre assaltos e outros actos violentos. Escandalizam os casos de jovens que consomem substâncias ilegais em lugares públicos, sem que ninguém os aborde de forma sancionatória ou solidária.
Peremptórios em tomar posições de defesa do bem público, muitos reclamam mais segurança, pedem polícia nas ruas, câmaras de vigilância nas esquinas da cidade, alarmes nas portas e sensores à saída dos estabelecimentos comerciais. Reclamam uma sociedade mais segura e, por isso, não duvidam da necessidade em encarcerar os criminosos, identificar os delinquentes, denunciar os infractores e afastar da vista os que se atrevem a dormir à porta das lojas ou que pedem um euro num parque de estacionamento.
Ninguém fica indiferente quando surgem notícias sobre idosos abandonados em lares, onde não se respeitam as regras mínimas de segurança e bem-estar ou diante do rosto de uma criança que perdeu o sorriso.
O que quer que eu faça? O mundo está perdido! Isto vai de mal a pior!
Ali mesmo ao lado, vão criar uma casa para esses meninos de rua; naquela outra freguesia vai ser construída uma unidade de tratamento para jovens em estado avançado de dependência de substâncias psico-activas e já está sendo delineada a construção dos novos estabelecimentos prisionais. Não podemos admitir que os reclusos sejam empilhados em celas onde só deveriam estar metade dos que lá estão, nem esquecer que depois do cumprimento das penas há vida para essas pessoas. Se faz algum sentido a cadeia, que seja um tempo de reintegração e não apenas um caixote de lixo onde a sociedade despeja cidadãos infractores, violentos e indesejáveis.
De acordo. É preciso fazer alguma coisa por todos esses, mas será que tem de ser aqui na minha rua, à minha porta!? Não têm um outro lugar para construir essa casa, essa unidade de tratamento? Porque não escolhem uma outra freguesia para implantar o novo estabelecimento prisional, longe das pessoas de bem?
É que nunca se sabe o que esses jovens podem fazer? Temos de pugnar pela segurança e pelo sossego das nossas vidas.
Somos todos sensíveis aos problemas da sociedade, mas…
O que nos trama é esse “mas”, sinónimo das defesas construídas, do comodismo instalado, da falta de espírito voluntário para sermos proactivos, colaboradores nas respostas institucionais, promotores da inclusão que reconhecemos como um direito de cidadania, mas que nem sempre assumimos como um dever.
Se queremos uma sociedade mais segura temos de combater as desigualdades e promover uma maior justiça social.
A segurança dos cadeados, das câmaras de vigilância ou até dos polícias na rua, não tornam a sociedade mais justa.
A insegurança que nos aflige tem um rosto humano. São jovens sem rumo que há muito a família deixou de procurar; pequenos traficantes apanhados nas malhas de uma rede, que encobre outros cidadãos responsáveis; maridos que dominam as mulheres à força; famílias desestruturadas e sem recursos; empresários que não cumprem a lei e sujeitam os trabalhadores a condições precárias.
Somos todos sensíveis aos problemas da toxicodependência, da violência doméstica, da pobreza ou da exploração laboral, mas…
(publicado no Açoriano Oriental de 30 Março 2009)