Atributos
O grande mérito não está em afirmar que se conseguiu, mas em ser reconhecido pelo feito, não está em dizer que se é, mas em ser conhecido por ser.
Mas há quem necessite de falar de si, muito antes dos outros terem vislumbrado qualquer conteúdo nas qualidades que se afirmam, quais etiquetas que se colam num produto para fazer vender. Poderão cativar o comprador mais precipitado, que gosta de experimentar e não se importa de comprar as novidades. Depois, descobre que afinal os rótulos o enganaram, foi levado pela publicidade, mas nada do que constava na etiqueta e na imagem correspondia à verdade.
Hoje fala-se muito de marketing, da necessidade de promover os produtos num mercado repleto de alternativas, para combater a concorrência e ganhar consumidores. Mas o marketing, mesmo quando é muito bem feito, só funciona quando os produtos têm qualidade. Faz vender e, sobretudo, fideliza o comprador, porque quando anuncia qualidade, esta é comprovada, e a composição que vem escrita no rótulo é real quando se experimenta.
Atributos, qualidades ou adjectivos, também se aplicam a organizações, autarquias, governos, regimes políticos ou até empresas.
O importante é não ter pressa de se auto definir, com base nesses atributos. O importante é não etiquetar gavetas, que nunca tiveram conteúdo ou que ainda aguardam o dia em que o vão ter.
Não vale a pena começar por aí, ter uma sede para a associação, mas não ter sócios; ter o equipamento de jogo, mas não saber jogar; ter a fama mas não possuir experiência consolidada.
Hoje fala-se muito de sustentabilidade. Uma palavra nova, que no fundo significa a importância da autenticidade de um crescimento, suportado em recursos, em capacidade de manter uma produção ou uma relação, pensado a longo prazo, que não é um fogacho de faz-de-conta.
Sustentável é todo o desenvolvimento que não começa pelo atributo, pelo título de projecto ou pelo rótulo, mas que corresponde a experiência continuada, enraizada e estruturante.
Quando alguém ou alguma instituição se apressa a etiquetar o que ainda não fez ou não é, cria para si e sobretudo para os outros, a ilusão de uma realidade que está presa por alfinetes, descosida e pouco resistente.
Se quisermos saber o que valemos, o melhor é reparar no modo como somos reconhecidos. E nesse exercício de auto-análise, também é importante assumir que os outros também são bons a identificar os nossos defeitos e denunciar as acções menos conseguidas. Reconhecer esses insucessos também faz parte do crescimento sustentável. De outro modo, corre-se o risco de acabar vivendo detrás de um verniz de aparências, que disfarça o que não se é. Qual pintura que se dá na fachada de um prédio em risco de ruir, tapando as fendas e disfarçando o reboco que ameaça cair, compromete-se uma intervenção profunda, estrutural, que fortaleça o edifício.
As aparências iludem, sobretudo, quem as utiliza como disfarce, porque apenas adiam o cair da máscara, que sempre acaba por acontecer. Só quando os atributos são o resultado de experiências acumuladas, se tornam em fonte de reconhecimento.
(publicado no Açoriano Oriental, a 17 de Maio 2010)