Escutar é aprender
A experiência ensina que podemos aprender muito mais depressa se estivermos atentos, se escutarmos o que os outros falam, se nos concentramos nas explicações que nos são dadas ou simplesmente se formos armazenando informação.
Escutar é mais do que ouvir, é entender e abrir a nossa mente à novidade, ao momento. É deixar-se surpreender e não ter ideias feitas que nos impeçam de apreender os conteúdos que os outros nos transmitem.
Escutar é um dom, mas não é um privilégio dos ouvintes, porque não depende apenas do ouvir. Implica entender diferentes linguagens: a dos gestos, dos sinais, das posturas, das cores ou mesmo das tonalidades da natureza. Apesar dos sons serem fundamentais na construção dos ambientes, escutar difere do simples ouvir, desde logo pela atitude de quem o faz. Não se escuta se não se pára, se não se tira tempo para sentir, para estar.
Escutar é fundamental para conhecer. Logo, quem não o faz, é mais ignorante. Quem não se dispõe a ouvir as vozes e a procurar entender os significados, constrói um mundo de conceitos mais pobre, define os limites do possível de forma restrita.
Escutar abre as fronteiras do conhecimento e do pensamento e enriquece as relações. Entre pais e filhos, se os primeiros não escutarem os segundos, é muito provável que vivam numa ilusão de serem pessoas felizes. O silêncio, aparentemente sagrado, que rodeia essas relações extremadas, é um sinal de que ninguém se conhece, porque ninguém escuta o sentir do outro.
Entre governantes e cidadãos, detentores do poder, seja a que nível for e governados, se não houver lugar e espaço para a escuta, ou como juridicamente se diz, para as audições, o desconhecimento vertido em lei, em decreto, toma o lugar da realidade, rodeando o poder de defesas intransponíveis, alimentando os mitos como verdades absolutas.
Escutar só enriquece, só aumenta a capacidade de entender e de decidir. Escutar é, por isso, a expressão de quem tem a noção de que não é infalível, nem sabe tudo. Sem perder a sua condição e posição, seja como Presidente da República, director de uma empresa, pai ou simples cidadão, quem se dispõe a escutar o outro, contribui para melhorar a qualidade das relações, da democracia e sobretudo, é mais justo e pode pronunciar-se com mais propriedade sobre a realidade dos outros.
Em qualquer situação ou circunstância, são sempre várias as vozes e sobretudo diferentes as interpretações que podemos fazer de uma mesma realidade. Por isso, se queremos conhecer o mundo e as pessoas, se queremos descobrir uma terra ou um povo, não basta dizer, “eu já passei por lá”, é preciso ficar. Não basta dizer “eu já ouvi isso”, é preciso escutar novamente. Não basta dizer, “eu já sei o que vai dizer”, é preciso dar espaço ao outro e escutar os significados que se escondem detrás das suas palavras.
O dever de escutar é próprio da cidadania e não devia ser entendido como uma obrigação legal: políticos, agentes de segurança, professores e todos os profissionais que estão ao serviço das populações deveriam escutar mais; não por obrigação mas como exigência e necessidade. Porque só aprende e, logo, só conhece, quem se dispõe a escutar.
(publicado no Açoriano Oriental de 11 de Agosto 2008)