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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

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Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

Ser mordomo do Espírito Santo

 

 
 
 
 
 
Os antropólogos há muito que identificaram uma forma ritualizada de afirmação social, designada por potlatch, termo que significa Dar. Ao invés do prestígio social que se obtém pela acumulação de riqueza, no potlatch é a dádiva e o despojamento que conferem esse prestígio.
Nas Festas do Espírito Santo encontramos na figura do Mordomo ou do Imperador, alguém que, ao organizar a festa, assume as despesas, garante a distribuição das “pensões” pelos irmãos e proporciona um tempo de fartura e exaltação do culto.
No fim da festa, feitas as arrematações das oferendas, os irmãos sorteiam, entre os que a isso se dispõem, quem será o mordomo no ano seguinte e distribuem as sete “Domingas” que precedem a festa por outras tantas casas.
Este ritual confere ao tecido social de uma comunidade de vizinhança uma estrutura dinâmica, que não depende de cargos públicos ou de competências previamente determinadas, mas do espírito de entrega e despojamento de quem aceita ser mordomo e, por esse facto, acolhe na sua casa os símbolos maiores da festa, a bandeira e a coroa.
Em cada ano esse poder simbólico, porque transitório, muda de mãos e ganha um novo centro, uma nova morada, onde se levanta o altar, se enfeita um quarto e se recebe os vizinhos, em momentos de oração e de partilha.
As festas do Espírito Santo são a expressão mais genuína de um tecido social comunitário, que ainda hoje marca o mundo rural açoriano e se manifesta em algumas pequenas comunidades urbanas, uma rua, um bairro, onde a rede de relações próximas se transforma em irmandade.
A partilha da carne, do pão, da massa e do vinho, que foram antes abençoados na casa do mordomo e constituem as “pensões”, faz-se no espaço da família ou na via pública, onde todos têm lugar à mesa. Ninguém se atreve a desperdiçar esta dádiva, que é para muitos sagrada.
O povo açoriano tem pelo Senhor Espírito Santo um profundo e sentido respeito. E, apesar de reconhecer o prestígio que é devido ao mordomo, não aceita que alguém organize a Festa, que não seja para servir os irmãos, porque tal como no Potlatch, o importante é mostrar capacidade para dar.
(publicado no Açoriano Oriental de 20 de Julho 2009)
 

Segunda-feira da pombinha

Neste feriado misturam-se homenagens e sentimentos, uns mais ancestrais outros mais recentes. O dia da Região é, ao mesmo tempo, um dia de festa para os Açorianos que vivem a segunda-feira da pombinha, como oitava da festa do Espírito Santo; e a comemoração da Autonomia Regional que, desde há mais de trinta anos, enquadra a gestão política do arquipélago. Em comum, um traço único, a importância da proximidade e da unidade que transformam a diversidade insular em açorianidade. A irmandade do Espírito Santo que faz a festa, partilha a carne, o pão e o vinho ou as sopas, transforma uma rua ou uma localidade num espaço de festa, onde se esquecem desavenças, problemas e conflitos. Partilha-se a fartura e o prestígio e as bênções que a Coroa e a Bandeira, visitando várias casas durante sete Domingas, traz a cada família. A Autonomia regional transformou a diversidade na afirmação de uma identidade reconhecida, nos órgãos de poder próprio, e enraizada numa história e na açorianidade que sempre marcou a comunidade açoriana, onde quer que resida. A Autonomia não é apenas um quadro de referência política; é sobretudo a afirmação dessa identidade, durante demasiado tempo relegada para um plano secundário, ignorada pelo poder central que olhava para os Açores como ilhas “adjacentes”, longe da Metrópole, que alguns julgavam habitadas por indígenas e dotadas de caminhos de ferro. Passaram trinta anos e hoje, sobretudo para os jovens, viver isolados faz parte do passado. Para além dos aeroportos, as outras ilhas estão ao alcance de uma viagem de barco, a preço irrisório para quem tem menos de 24 anos; as escolas, estão acessíveis a todos e o prolongamento de estudos pode fazer-se até ao secundário em todas as ilhas, e o ensino superior é uma realidade. Os Açores dos novos tempos libertaram-se de um poder que esquecia e sobretudo desconhecia as necessidades destas comunidades, que vivem em espaços tão diferentes como o Corvo ou São Miguel; festejam as touradas na Terceira e o Senhor Santo Cristo em S.Miguel; comem rosquilhas no Pico ou bolos lêvedos nas Furnas. Hoje, a Região dotada de uma bandeira e de um hino, não é apenas um lugar de naturalidade ou residência, que se inscreve por acaso no bilhete de identidade, mas o sinónimo do enraizamento afectivo numa comunidade, que se cola à pele como parte do próprio ser. Ser açoriano, é ter orgulho de pertencer à terra onde se nasceu ou que se adoptou por residência, porque há muitos açorianos que, adoptando viver nesta terra, dela são filhos do coração. Ser açoriano não é um acaso, é ser dotado de uma fibra que estrutura a identidade, que mergulha os nossos ossos no mar, como diz Nemésio, e que se reconhece na melodia dos sotaques, na sonoridade de uma viola da terra e se vive de forma comunitária nas festas do Espírito Santo, seja na ilha ou nas comunidades emigradas, do Brasil ao Canadá. Hoje animados por esse Espírito, os açorianos assumem-se, como diz a letra do seu hino, como “um povo triunfal”, disposto sempre a lutar e a batalhar, porque a história de muitas gerações e de muitos autonomistas assim nos ensinou e o futuro das novas gerações assim o exige. Em Segunda-feira do Espírito Santo, comemoram a Autonomia, partilhando a fartura e a alegria, as bênções e a confiança que sempre animou esta gente. “Para a frente, Açorianos! Pela paz à terra unida. Largos voos, com ardor, firmamos, para que mais floresçam os ramos da vitória merecida.”

(publicado no Açoriano Oriental a 12 Maio 2008)

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