Turismo e Identidade
O aumento do número de visitantes tem transformado o turismo numa "mina". Os alojamentos locais proliferam, os restaurantes ganham clientes e os locais de interesse enchem-se de curiosos, guardando imagens, fazendo selfies ou vídeos.
Tudo parece ser fácil e ganhador, quando se pensa em turismo. Mas há um senão!
O que levaram os visitantes dessas viagens? E o que deixaram nas regiões visitadas? Numa visão económica, contam os fluxos financeiros e o número de camas ocupadas ou de passageiros desembarcados.
Mas será que estes visitantes fizeram experiências que agora recordam ou, simplesmente, registaram no telemóvel uma coleção de fotografias?
Os resultados do turismo não se medem apenas por indicadores económicos. O que fica registado são, sobretudo, experiências, contactos, aprendizagens e práticas, que envolveram os sentidos. Os sabores da terra, descritos por quem serviu a refeição, a beleza de uma tapeçaria, explicada por uma artesã, as cores da paisagem ou a qualidade do alojamento, também são resultados do turismo, mas que os visitantes levam gravados na memória.
O turismo que faz sair as pessoas da rotina, dos circuitos fechados e habituais, permite, a quem recebe, mostrar um mundo desconhecido do visitante. Um encontro com a novidade, o particular, onde o turista se integra sem destruir, paga para experimentar, investe para poder alargar horizontes e, quando regressa a casa, leva consigo um outro olhar sobre esse mundo.
Esta forma de receber valoriza a identidade e pode contribuir para a criação de negócios enraizados no património das comunidades.
De nada serve fazer igual aos outros, ter restaurantes com sobremesas sem nome e sem tradição. Não vale a pena vender praia e sol, quando o clima é incerto, e muito menos explorar locais de natureza, que não resistem à pressão de muitos visitantes.
O que é "pequeno e bom" proporciona uma maior intensidade da experiência, porque feito com qualidade. O importante é proporcionar uma viagem através da história, do património e, sobretudo, das emoções e sensações.
Recordo um restaurante em Arraiolos, em pleno Alentejo, onde se pode fazer uma viagem no tempo, através dos objetos da lavoura que servem de decoração. Na ementa, os pratos convidam a outras tantas experiências gastronómicas, à descoberta das gentes da terra e dos sabores locais. Mais à frente, numa tenda de tapetes, uma artesã mostra, com orgulho, o restauro de um velho tapete e a beleza do bordado tradicional.
Talvez seja esse o segredo de um bom produto turístico. Quem o vende, tem orgulho no que faz e na terra onde vive e, ao mesmo tempo, é capaz de contar uma história acerca dos produtos, da confecção ou da razão porque, nessa região, se fabrica, consome ou trabalha de uma determinada forma.
O turismo de uma região tem de ter forma, marca, identidade. Se não, é um produto que facilmente se deita fora, depois de se experimentar uma vez. Não deixa memórias ou recordações e, dificilmente, alguém vai contar essas experiências a outros.
O turismo, com identidade, cresce em função das histórias que se contam aos outros.
Mas, para se contarem histórias é preciso viver experiências e ter sido acolhido, na conversa de café, na visita ao museu ou num simples diálogo com o residente que nos indica um trajeto. O que ficam são essas recordações.
O turismo cresce em função do acolhimento.
Não bastam alojamentos locais, improvisados, são precisos "acolhimentos locais". Nem é preciso ter grandes salas de refeições, mas servir uma gastronomia de qualidade em espaços acolhedores, que falem das origens ou conduzam o visitante numa viagem de sabores.
O turismo, com identidade, é sustentável, traz os amigos dos amigos e gera memórias e recordações.
(artigo publicado no jornal Açoriano Oriental de 3 Abril 2018)