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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

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Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

Turismo e Identidade

O aumento do número de visitantes tem transformado o turismo numa "mina". Os alojamentos locais proliferam, os restaurantes ganham clientes e os locais de interesse enchem-se de curiosos, guardando imagens, fazendo selfies ou vídeos.

Tudo parece ser fácil e ganhador, quando se pensa em turismo. Mas há um senão!

O que levaram os visitantes dessas viagens? E o que deixaram nas regiões visitadas? Numa visão económica, contam os fluxos financeiros e o número de camas ocupadas ou de passageiros desembarcados.

Mas será que estes visitantes fizeram experiências que agora recordam ou, simplesmente, registaram no telemóvel uma coleção de fotografias?

Os resultados do turismo não se medem apenas por indicadores económicos. O que fica registado são, sobretudo, experiências, contactos, aprendizagens e práticas, que envolveram os sentidos. Os sabores da terra, descritos por quem serviu a refeição, a beleza de uma tapeçaria, explicada por uma artesã, as cores da paisagem ou a qualidade do alojamento, também são resultados do turismo, mas que os visitantes levam gravados na memória.

O turismo que faz sair as pessoas da rotina, dos circuitos fechados e habituais, permite, a quem recebe, mostrar um mundo desconhecido do visitante. Um encontro com a novidade, o particular, onde o turista se integra sem destruir, paga para experimentar, investe para poder alargar horizontes e, quando regressa a casa, leva consigo um outro olhar sobre esse mundo.

Esta forma de receber valoriza a identidade e pode contribuir para a criação de negócios enraizados no património das comunidades.

De nada serve fazer igual aos outros, ter restaurantes com sobremesas sem nome e sem tradição. Não vale a pena vender praia e sol, quando o clima é incerto, e muito menos explorar locais de natureza, que não resistem à pressão de muitos visitantes.

O que é "pequeno e bom" proporciona uma maior intensidade da experiência, porque feito com qualidade. O importante é proporcionar uma viagem através da história, do património e, sobretudo, das emoções e sensações.

Recordo um restaurante em Arraiolos, em pleno Alentejo, onde se pode fazer uma viagem no tempo, através dos objetos da lavoura que servem de decoração. Na ementa, os pratos convidam a outras tantas experiências gastronómicas, à descoberta das gentes da terra e dos sabores locais. Mais à frente, numa tenda de tapetes, uma artesã mostra, com orgulho, o restauro de um velho tapete e a beleza do bordado tradicional.

Talvez seja esse o segredo de um bom produto turístico. Quem o vende, tem orgulho no que faz e na terra onde vive e, ao mesmo tempo, é capaz de contar uma história acerca dos produtos, da confecção ou da razão porque, nessa região, se fabrica, consome ou trabalha de uma determinada forma.

O turismo de uma região tem de ter forma, marca, identidade. Se não, é um produto que facilmente se deita fora, depois de se experimentar uma vez. Não deixa memórias ou recordações e, dificilmente, alguém vai contar essas experiências a outros.

O turismo, com identidade, cresce em função das histórias que se contam aos outros.

Mas, para se contarem histórias é preciso viver experiências e ter sido acolhido, na conversa de café, na visita ao museu ou num simples diálogo com o residente que nos indica um trajeto. O que ficam são essas recordações.

O turismo cresce em função do acolhimento.

Não bastam alojamentos locais, improvisados, são precisos "acolhimentos locais". Nem é preciso ter grandes salas de refeições, mas servir uma gastronomia de qualidade em espaços acolhedores, que falem das origens ou conduzam o visitante numa viagem de sabores.

O turismo, com identidade, é sustentável, traz os amigos dos amigos e gera memórias e recordações.

(artigo publicado no jornal Açoriano Oriental de 3 Abril 2018)

Identidade açoriana

Somos de alguma parte, de uma terra, de um país.

Dentro de nós há um lugar, que surge como um filme que se revê, sempre que fechamos os olhos. Cores, cheiros e até sons ou vozes animam a tela da nossa mente, quando recordamos lugares de infância, a casa dos avós ou a freguesia onde ainda temos família, que agora visitamos nas férias. Um lugar onde aprendemos a ser pessoas e onde, quis o destino, aprendêssemos a falar com um determinado sotaque e onde aprendemos a descobrir quem somos e porque estamos aqui.

Dentro de nós há raízes profundas que nos agarram por dentro e, por mais que viajemos, representam um lugar seguro, onde respiramos melhor e nos sentimos em casa.

A identidade é essa forma própria de ser, que não se molda nem se desfigura, que não se verga nem pode ser destruída, mesmo quando os dramas da história comprometem a sua existência, como aconteceu com comunidades da América latina, exterminadas pela colonização, que hoje sobrevivem no seu património e sabedoria ancestrais.

Dentro dos açorianos, há uma fibra que não se verga, uma rocha que não quebra, um cheiro a mar que não se apaga. Dentro de cada açoriano, há a certeza de pertença a estas ilhas, mesmo quando o destino quis que vivessem longe, em terras da emigração ou no continente. Dentro daqueles que, não sendo açorianos, adoptaram esta terra por sua, há um sentimento de pertença. E não é por acaso.

Viver nestas ilhas cria raízes. É difícil escapar à força desta gente que soube transformar pedreiras em terras de pão, enfrentou baleias em mar alto e se defendeu dos ataques da pirataria.

A identidade açoriana dificilmente pode ser entendida fora do universo de crenças que marca a história deste povo, que viu na natureza a força de um Deus que castigava e na oração um laço que transformava o medo em esperança. As romarias, as coroações, os bodos de leite e as promessas são bem a imagem desse povo crente que, perante a desgraça se volta para o outro, reforça a solidariedade e é capaz de mudar de vida.

Somos um povo de crentes, por isso o Espírito Santo não é apenas mais uma festividade, mas a expressão da própria identidade açoriana. Durante semanas, as famílias que aceitam uma “dominga” nas suas casas, rezam em comunidade; os mordomos que se dispõem a organizar a festa, preparam as pensões, as dádivas e fomentam a partilha.

Em dia de festa, a coroação é sem dúvida o seu momento mais importante, mas quem é coroado é sempre o mais humilde, aquele que se dispõe a aceitar a protecção do divino.

Somos um povo de gente humilde que aprendeu, na adversidade, a partilhar a fartura e a se alegrar com isso. Não se recusam convivas à mesa das sopas e ninguém nega um lance nas arrematações, em louvor do Senhor Espírito Santo.

Somos um povo com raízes. Raízes no mar, mas que identificam e nos prendem a estes pedaços de terra onde nos sentimos em casa, envoltos pelo cheiro do incenso que cobre o chão dos quartos, em dia de festa, e veste as ruas em dia de procissão.

Não há melhor traço para unir os açorianos, onde querem que vivam, do que invocar o Espírito Santo, que o povo aprendeu a venerar, fora e dentro das igrejas.

Por isso, o povo se sente identificado por ser na oitava da festa de Pentecostes que a Região festeja o seu dia e reaviva as suas raízes, que afirmam e distinguem a açorianidade.

(publicado no Açoriano Oriental, a 13 Junho 2011 - Dia dos Açores)

Ser pessoa, imperfeita

O mundo gira à nossa volta e bombardeia-nos com opiniões, escolhas possíveis e modelos de comportamento. Sentimos a pressão dos que nos educam, dos que são nossos chefes, do rumor das vizinhas que criticam ou os comentários que desdenham daquilo que nos torna diferentes.

No meio desta pressão diária, há quem deixe de valorizar o seu próprio pensamento, para ser uma caixa de ressonância da voz de outros. Vivem para ser a mulher que o marido deseja, o empregado que o patrão dá como exemplo, o filho exemplar que não dá problemas e, aparentemente, são cidadãos perfeitos.

Apetece gritar, comecem a pensar por si, pela vossa cabeça.

Viver no mundo não é uma fatalidade com destino único, é um desafio à criatividade.

Só descobrimos o que realmente é ser livre, quando aprendemos a fazer escolhas. Tão simples como comer muito ou o suficiente, cuidar de si ou desleixar, organizar o espaço ou acumular, recusar o que não se quer ou aceitar. É dessas escolhas que depende a nossa felicidade ou infelicidade.

É claro que não podemos viver no mundo, sem aceitar regras, sem estar em comunidade, mas viver é muito mais, exige pensar e reflectir o que nos dizem desse mundo.

Ser mulher ou ser homem não é vestir um fato, com se fosse um disfarce de carnaval, mas interpretar o ser pessoa de uma forma própria. Ouvir e ser capaz de pensar o que nos dizem; sentir e falar do que se sente; acreditar, ter opinião e não ter receio em mudar quando alguém nos faz descobrir uma outra face da realidade.

Não somos uma caixa de ressonância, mas um instrumento musical.

É no exercício dos direitos que defendemos, que afirmamos a cidadania, a musicalidade da nossa vida e assim, mudamos o mundo. Não basta vir para a rua gritar “basta”; de nada serve dizer que há injustiça, respeitem os nossos direitos” e depois esperar que alguém ouça a nossa voz. Se queremos mudanças, temos de alterar as nossas relações, aumentar o empenho e esforço que colocamos na vida diária. Ninguém pode ficar à espera que primeiro mudem os outros. Se o seu mundo não é perfeito, então avance, denuncie, faça o mundo acontecer de outro modo.

Não vai mudar! Respondem os cépticos. É possível, mas então a minha vida terá valido a pena, porque procurei não viver diluído nessa massa aglutinadora, imperfeita, que parece triturar os diferentes e bloquear os audazes. Precisamos do desafio que é vencer essa imperfeição, para não nos cansarmos de viver e nos motivarmos na procura da felicidade.

Não há vidas perfeitas. O que há são mais ou menos oportunidades, que se agarra ou se deixa fugir; pessoas que investem em si e acreditam no outro; que se esforçam e nunca desistem de aprender, que contrastam com aquelas que nunca se dispõem a mudar de vida e baixam os braços na adversidade.

Repenso o meu percurso, revejo vidas que se cruzaram com a minha e encontro homens e mulheres imperfeitos, mas que procuraram a melhor forma de ser feliz. E, hoje, são para mim referências do que é, verdadeiramente, ser pessoa.

(publicado no Açoriano Oriental de 7 de Março 2011)

A transparência da máscara

De rosto pintado, o palhaço carrega no traço que contorna os olhos e os lábios e constrói uma figura alegre, supostamente divertida, que provoca sorrisos, mesmo antes da sua actuação. O palhaço compõe um personagem, que depois recheia com a sua actuação, escondendo a identidade verdadeira do actor. Ninguém reconhece o palhaço quando este retira as pinturas e guarda a máscara divertida na mala de circo.

Somos todos um pouco palhaços na vida.

Os outros olham-nos de fora, apreciam as roupas que vestimos, comentam o corte de cabelo, elogiam os sapatos ou o anel de noivado. Mas nem sempre reparam em nós, por detrás desses acessórios. Não vêem a tristeza que escapa no olhar e não se apercebem que vivemos mal com os quilos a mais, a ruga que se formou na testa ou o pneu que não há maneira de desaparecer.

Como se estivéssemos por detrás de uma máscara, sentimos que poucos nos conhecem ou se apercebem que somos mais do que aquilo que mostramos.

É a palavra que nos revela, são os sentimentos e as emoções que nos traem, é aquela lágrima de emoção que dá brilho ao olhar ou a voz que, sem querer, fica baça, que dá transparência ao disfarce que vestimos.

Há quem se julgue protegido, porque elaborou uma máscara perfeita. Veste roupas de marca, cuida da pele e até enche as rugas para disfarçar o envelhecimento precoce; pinta o cabelo, cuida das unhas e não há um fio fora do sítio. Tudo parece perfeito, o perfume, a maquilhagem, a escolha das cores e a composição da indumentária.

Esquecem-se de controlar o olhar. É por aí que são traídos, pelas palavras que escapam sem se darem conta ou a postura das mãos, inquietas e suadas. Nessa hora, a máscara começa a ficar transparente desvendando sentimentos confusos, inquietudes escondidas, tristezas não reveladas.

Não é fácil penetrar nessa dimensão humana que se esconde detrás das máscaras sociais, desconstruir personagens diluídos numa massa anónima.

Ser pessoa até pode significar ser personagem, numa alusão ao teatro da vida que é estar em sociedade. Mas, se todos reconhecem que dentro de um palhaço há alguém que vive de outro modo, por detrás da imagem que cada um de nós procura transmitir, há um ser que sente, sofre, vive alegrias ou ansiedades, nem sempre reveladas. Alguém que não diz tudo o que pensa e que observa, do lado de dentro de si mesmo, as reacções dos que comentam sem perceber, criticam sem conhecer, apreciam sem avaliar o que realmente somos.

A máscara faz parte do nosso dia-a-dia, sempre que nos olhamos ao espelho, para pentear o cabelo, disfarçar as olheiras, fazer a barba ou apertar a borbulha que resolveu crescer mesmo no meio do nariz.

Afinal quem somos? Até que ponto damos transparência a este disfarce diário, fazendo passar emoções e sentimentos, afirmando aquilo em que acreditamos, assumindo posições, defendendo causas e esgrimindo argumentos?

Quando alguém se esconde e se refugia em modelos pré-definidos, torna-se numa pessoa vazia de ideias, opaca. De tanto esconder o que sente, endurece a máscara e perde a capacidade de ser transparente.

A felicidade depende da capacidade de viver, na pessoa que somos, dando transparência às máscaras que a vida nos impõe.

 (publicado no Açoriano Oriental, 2 de Agosto 2010)

O mar que me veste

O mar dos Açores é uma outra pele para quem é insular.

Quando mergulho nestas águas, que são nossas por herança, sinto-me vestida por dentro, como se este mar fosse parte de mim.

O mar que rodeia a ilha onde nasci não é uma moldura que limita um quadro, mas um horizonte que alarga os limites da terra.

Somos parte deste mar, não tenho dúvidas. Sinto-o, sempre que mergulho no oceano, é como se reencontrasse o seio materno e redescobrisse a identidade que afirmo sem ver, que me condiciona mesmo quando julgo estar a ser livre na minha forma de ser.

Sou insular, sou ilhoa em bom português, e sinto uma honra imensa de o dizer e de o viver, em cada dia que passa. Gosto demasiado da minha terra, para aceitar que alguém a veja ou pense nela de forma que não seja de profundo respeito. Sou sensível aos gestos de apoio e acredito que temos de ser optimistas, temos de ter força de vontade se queremos levar o nosso povo, do Corvo a Sta. Maria, a ter as melhores condições de vida e o acesso, que merece, aos recursos que podem potenciar a nossa identidade e o projecto de desenvolvimento que queremos para a nossa terra.

O mar que rodeia estas ilhas não é uma massa profunda de água, mas um mundo vivo, onde a fauna e a flora, que as nossas ilhas têm, mas em quantidade limitada, é de uma imensidão que ainda não aprendemos a descobrir.

Temos o mundo à nossa volta e por vezes ainda nos julgamos pequeninos.

O mar das nossas ilhas é fonte de vida e dá sentido à nossa vida, porque nos veste como uma pele, nos identifica como o sangue que corre nas veias e nos abre horizontes, de conhecimento, comunicação e descoberta.

Não podemos parar, não podemos ficar a olhar do alto das rochas negras, com sentimentos pessimistas. Temos de ir sempre mais além... porque este mar não é barreira, mas futuro...

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