Quem tenha lido parte do discurso da Presidente da Câmara de Ponta Delgada, sobre insegurança, aparentemente consegue identificar a explicação causal para um tal problema. Juntam-se 1223 jovens desacompanhados e desempregados, mais aqueles que se enquadram em programas de apoio, com o consumo de drogas, álcool, numa qualquer freguesia ou cidade sem polícias à vista, e o resultado é termos um quadro de insegurança.
Esqueceu a Presidente da maior autarquia, também Presidente da Associação dos Municípios da Região Autónoma dos Açores, que há outras variáveis, ou se quiser parcelas, que devem ser interligadas com esta receita da insegurança.
Esqueceu de contabilizar, por exemplo, que o consumo de álcool também se promove num centro histórico como o da cidade de Ponta Delgada de onde se vão afastando os residentes e que, aos poucos, se transforma quase todas as noites numa discoteca ao ar livre, povoada de pequenas multidões em várias esquinas e recantos até altas horas da madrugada.
Esqueceu a autarca de considerar que o consumo de caipirinhas, caipiroscas e outras misturas é o grande atractivo das Noites de Verão, onde se come pouco e se bebe muito e onde o controlo da idade do consumidor é, por ventura a última coisa de que o vendedor se lembra de perguntar, apesar de o seu partido ter recentemente apresentado uma proposta para que a venda de álcool seja interdita da menores de 18 anos.
Esqueceu a Sra. Presidente de reflectir sobre os concelhos e as freguesias onde acontecem os casos que referiu. Ou será que Ponta Delgada é um paraíso em matéria de criminalidade e outros problemas associados, como a delinquência juvenil? Tal não parece. Se compararmos os dados publicados pelo INE, entre 2004 e 2005, a criminalidade aumentou 7,5% no Concelho de Ponta Delgada, enquanto que na Região Açores o aumento foi de 4,7%. E, se atendermos ao tipo de crime, no que toca aos crimes contra as pessoas, que incluem os que atentam contra a integridade física, enquanto na Região o aumento foi de 8,8%, no concelho de Ponta Delgada foi de 22,2%.
Refere a Presidente de Ponta Delgada “esta não é uma responsabilidade das autarquias”. A culpa é dos governos e da falta de meios de defesa dos polícias. A Câmara até contribuiu para melhorar a situação e aguarda ter uma Polícia municipal para que a PSP, mais livre, possa vigiar o comportamento desses 1200 jovens que andam à solta!
Quem ouça a Sra. Presidente, a gestão autárquica de Ponta Delgada em nada contribui para a criminalidade, a violência doméstica e outras formas de conflitos, quando constrói habitação social em zonas isoladas sem acesso e sem espaços comunitários. A autarquia não é responsável quando trata as freguesias periféricas da cidade como subúrbios, concentrando habitação a baixo preço, isolando essas famílias do tecido urbano, das escolas e de outras instituições.
Refira-se que esta Câmara não tem nenhum Plano de combate contra as dependências, e certamente não é por falta de recursos, mas por opção. Opta antes por investir milhões de euros em estradas, supostamente para consolidação ambiental, como o prolongamento da avenida para São Roque ou para Santa Clara e investe milhões em parques subterrâneos. Aparentemente, é tão competência do governo ou da Câmara fazer estradas e parques. Porque será então que ao invés das obras de betão, onde a autarquia gosta de tomar a dianteira, no domínio da acção social, prefere recuar e afirmar que não é consigo?
Onde está a promoção de projectos de apoio aos tais jovens sem acompanhamento nas freguesias periféricas, em parceria com a comunidade local? A Câmara não tem de fazer tudo, mas pode ser uma parceira importante na promoção de intervenções que fixem os jovens a projectos inovadores, em particular na periferia da cidade.
A segurança Sra. Presidente da Câmara não passa apenas por polícias e repressão, mas por soluções integradoras e fomentadoras de estilos de vida saudáveis, estáveis e estimulantes. Incentivar o desporto, criando condições em zonas periféricas, apoiando associações e clubes de bairro; investir em escolas do 1.ºciclo de qualidade que tenham mais do que salas de aula, mas estejam dotadas de espaços apropriados para a prática da investigação, da música ou de outras acções, são áreas de intervenção das autarquias, para as que têm sensibilidade e capacidade estratégica para tal.
Sra. Presidente da Câmara, é fácil acusar os outros do lado negro da vida, e sentar-se ao sol, tranquilamente a observar.
A segurança é sem dúvida uma necessidade humana que se for abalada gera ansiedade e, sobretudo, carece sempre de uma explicação. Mas há que ser honesto porque este é um problema social onde se entrecruzam diferentes causas, responsabilidades e factores potenciadores, e onde à semelhança de outros, pela acção ou omissão a autarquia também é co-responsável.