A Tolerância
“Já será grande a tua obra se tiveres conseguido levar a tolerância ao espírito dos que vivem em volta; tolerância que não seja feita de indiferença…e que, afirmando o que pensa, ainda nas horas mais perigosas, se coíba de eliminar o adversário e tenha sempre presente a diferença das almas e dos hábitos”. (Agostinho da Silva, Considerações)
Por vezes confunde-se tolerância com falta de firmeza. Aceita-se tudo, porque se entende que a liberdade individual é sinónimo de espaço sem fronteiras, discurso sem controlo, comportamento sem regras.
A tolerância não é certamente indiferença, como refere Agostinho da Silva, mas capacidade de entender os outros, mesmo que adversários, na sua diversidade de pensamentos e acções. Nesse sentido, a tolerância é necessária quando se discutem ideias e se procuram soluções consensuais. Sem eliminar o conflito, evita que a discordância se torne em agressividade descontrolada.
O tolerante, sendo próximo, consegue se distanciar perante os problemas, para melhor os ver e sobre eles discernir. Afinal, todos sabemos que quando uma discussão se torna acalorada, ninguém tem razão e os argumentos resvalam, com facilidade, para a ofensa e a agressão.
Ser tolerante é ter presente a diferença e ser capaz de a valorizar nas relações, na produção de um trabalho, na realização de um projecto. Sem negar as tensões que daí advêm, a tolerância é, por ventura, uma condição essencial para garantir o equilíbrio nas relações humanas, seja na família e no mundo mais privado ou no espaço público. Quantos divórcios não são fruto de uma intolerância persistente perante diferenças conhecidas desde o casamento, mas que se tornam inaceitáveis com o passar do tempo? Quantos conflitos entre gerações não resultam da intolerância perante a diferença de idade e de experiências a esta associadas? Quantos desencontros, rupturas no mundo do trabalho, não são o resultado da prepotência de quem decide sem ouvir, escolhe sem pensar e manda sem consultar?
A tolerância é sem dúvida uma virtude que alguns cultivam e outros poderiam aprender. Do cimo da sua prepotência, julgam dominar o mundo porque silenciam as diferenças.
“A tolerância em face do que esmaga não anda longe do temor; então, antes os quero violentos que cobardes.” (Agostinho da Silva, Considerações)
(Publicado no Açoriano Oriental a 11 Janeiro 2010)