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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

Da compaixão à solidariedade

Para percebermos o que se entende por compaixão e solidariedade, temos, antes de mais, de visitar a nossa área mais privada, o nosso interior, como pessoas.

A compaixão não se aprende, descobre-se, quando procuramos a essência do que é ser humano, ser uma pessoa “decente”; o que é a dignidade humana.

Falar de compaixão é falar da própria essência do amor humano.

A compaixão aprofunda a capacidade do ser humano de se colocar no lugar do outro; leva-nos a “sentir pelo outro”, a partilhar o seu sofrimento e compadecer-se da sua situação. Ser compassivo é entender a dor de outra pessoa e desejar diminuir/aliviar esse sofrimento.

A compaixão é por isso a capacidade para sentir o outro, por isso, humaniza o olhar quando toca as necessidades humanas mais urgentes e imediatas.

A compaixão cria unidade com o outro – por isso é uma pré-condição para a humanidade.

Mas se somos capazes de sentir compaixão por quem sofre, o que dizer de nós mesmos, será que somos compreensivos connosco próprios, em momentos de sofrimento, falha ou dificuldade, ou pelo contrário, somos extremamente autocríticos, não aceitamos as nossas imperfeições, como parte da nossa própria condição humana?

Será que somos capazes de olhar a nossa própria fragilidade com a mesma abertura com que olhamos a fragilidade do outro?

A compaixão gera vontade de agir e faz-nos colocar ao dispor do outro, de coração aberto. Mas é fundamental que coloquemos algum distanciamento, se queremos que a nossa ação seja transformadora.

Se agirmos no calor da compaixão, podemos correr o risco de ser precipitados na reação ao sofrimento do outro, demasiado envolvidos emocionalmente, sem capacidade para medir consequências.

A compaixão tem de se transformar em solidariedade, para que a ação seja eficaz.

Os gestos solidários não são motivados pelo imediatismo da compaixão que pode tolher o discernimento; exigem diagnóstico, avaliação de recursos e planeamento das ações, com objetivos definidos.

O que se pretende com os gestos de solidariedade é mudar, transformar, na concretização do bem comum e, sobretudo, reafirmando o reconhecimento e o valor da humanidade.

São esses os valores que motivam os atos solidários.

A solidariedade implica respeitar a individualidade de quem se defende ou ajuda, particularmente aqueles que sofrem.

Por isso, a solidariedade, sendo filha da compaixão, exige diálogo, respeito pela posição do outro e pelas suas decisões; agir nas carências e dar as ferramentas que faltam para que as pessoas ajudadas possam, em cooperação, resolver os seus problemas.

A solidariedade visa sempre a inclusão, trazer aqueles que estão afastados, marginalizados, sem voz para a praça pública, para o exercício pleno dos seus direitos.

Por ser uma prática coletiva, a solidariedade é mais eficaz quando é praticada em grupo, sejam comunidades locais, grupos de vizinhança, paróquias ou associações.

A solidariedade gratifica, não porque envolva um retorno financeiro, mas porque alimenta a conexão com os outros. Para além disso, aumenta o sentimento de autossatisfação e torna os cidadãos melhores pessoas.

Se fomos ou somos solidários, é porque sentimos compaixão pela condição difícil de outros. E, essa palavra certa, esse gesto de apoio eficaz, pensado, foi o suficiente para que alguém passasse a encarar de forma diferente a sua dificuldade.

A compaixão e a solidariedade são as únicas armas que podem combater o individualismo e o isolamento.

Se queremos ser felizes, sejamos pessoas de compaixão capazes de gestos solidários!

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 31 de outubro 2025).

Democracia em perigo

Está na ordem do dia o debate sobre se a Democracia corre perigo, não apenas em Portugal, mas um pouco por toda a Europa e, particularmente, nos Estados Unidos.

Este debate é muitas vezes atravessado pelo confronto com posições autoritárias, autocráticas, que parecem emergir de um passado, que se julgava “enterrado”, mas que reaparece, particularmente aceso, nas posições dos mais jovens.

Segundo algumas sondagens, os ideais proclamados pelas forças populistas radicais, do espetro político, colhem a adesão dos jovens do século XXI, nascidos em democracia, sem experiência de viver numa sociedade onde se limitava a liberdade de expressão, se discriminavam as mulheres, os diferentes na etnia ou na religião e se controlava a livre expressão dos jornalistas e da comunicação social.

De acordo com um recente estudo do European Policy Centre, os rapazes portugueses, com menos de 25 anos, votam cinco vezes mais do que as raparigas na extrema-direita, sendo uma das causas a frustração por estarem a perder o emprego estável e a independência financeira que constituem marcadores tradicionais de masculinidade. O sucesso das mulheres nas universidades e na vida económica e política (veja-se o número crescente de presidentes de câmara) parece incomodar alguns destes jovens.

Como consegue a extrema-direita colher estes apoios dos mais jovens?

Se pensarmos nas estratégias autoritárias, em diferentes contextos, há uma prática comum. Alimentam-se os egos feridos e o receio perante os “outros” que ocupam os lugares por mérito e trabalho. Desconfia-se dos que vêm de fora, os imigrantes, e desvalorizam-se as necessidades dos que recebem apoios do Estado. Recuperam-se velhos estigmas associados à cor da pele ou ao grupo étnico e transferem-se para esses “outros” todos os males de que padece a sociedade, sobretudo a insegurança.

Aos poucos vai-se abandonando o discurso que defende a inclusão, a integração, a paridade e a equidade.

O autoritarismo infiltra-se na sociedade, rompendo os laços de solidariedade, que constroem as comunidades, pondo em causa a pertinência das estratégias de combate à exclusão ou às desigualdades. Dessa forma, reforça atitudes individualistas, segregadoras e securitárias.

Numa sociedade individualista, o “mérito” é visto como um privilégio que apenas se reconhece em alguns.

Como se faz oposição ao autoritarismo?

As estratégias passam por: alimentar o sentido de comunidade; fomentar o encontro e o diálogo social; ouvir as pessoas, antes de decidir; manter as políticas públicas que reduzem as desigualdades e promovem os direitos de cidadania para todos; participar em atividades associativas, de voluntariado e de serviço público; defender o bem comum.

A democracia não se defende com a violência das armas, das palavras ou das atitudes. A democracia exige reconhecimento do outro, empatia e capacidade de trabalhar em conjunto.

Quem julgar que constrói uma sociedade democrática, insultando os adversários, ridicularizando os mais frágeis, está matando a democracia aos poucos, criando o terreno favorável para que tudo pareça um caos. E, nesse quadro, só o líder poderá salvar o povo, como demonstra a história de todos os ditadores. Nele se colocam todas as esperanças e até se desculpam as falhas de integridade e as inverdades.

A democracia está em perigo quando se abandonam os ideais de liberdade, igualdade e justiça e se deixa de acreditar no bem comum.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 17 de outubro 2025)

Poder de proximidade

Estamos em plena campanha eleitoral para as autárquicas, as eleições que envolvem mais cidadãos, em listas para as juntas de freguesia, assembleias municipais e vereações.

Este é também o poder com mais história no país, mas que só ganhou autonomia com a implementação do Poder local democrático em Portugal. Recordemos que, antes de 1974, os presidentes de câmara eram nomeados pelo governo e não eleitos em sufrágio direto.

O poder local é um poder de proximidade, que reflete a diversidade de preocupações e necessidades do tecido social e, no caso dos Açores, as especificidades de cada concelho e ilha.

Um autarca é por isso alguém que conhece a sua comunidade e em equipa, apresenta um projeto de desenvolvimento local, tendo por base os recursos e as potencialidades dos munícipes e, ao mesmo tempo demonstra capacidade de convocar apoios, financeiros, técnicos e humanos, ao nível dos governos regional, nacional e europeu, para investir na melhoria do quotidiano da sua comunidade.

Quando um qualquer partido indica um candidato que não tem qualquer ligação à freguesia ou ao concelho onde pretende ser eleito, revela desrespeito pela comunidade local e compromete a ligação próxima que se estabelece no poder autárquico. Porventura esse candidato “paraquedista”, que conhece aquela comunidade por lá ter passado umas férias, esconde-se detrás de um líder nacional que é bandeira para qualquer ato eleitoral. Mas na realidade, está distante da história e das necessidades do povo que é suposto defender, que conhece de forma superficial.

O poder local tem de ser protagonizado por pessoas, genuinamente identificadas com as comunidades onde pretendem ser eleitas. São candidatos/as que trazem no discurso a força de um povo e no coração as suas principais necessidades.

Esta proximidade dá força aos autarcas, aproxima o poder político das pessoas e contribui para a humanização da política e dos políticos.

Por isso, para se fazer uma escolha mais acertada do/a candidato/a que se apresenta nestas eleições, é necessário estar atento e reconhecer quem está disponível para o diálogo, quem ouve os anseios e revela um discurso honesto nas respostas que sabe ser possível ou, pelo contrário, difícil de concretizar.

A proximidade faz-se de empatia, ou seja, a capacidade de se colocar no lugar do outro. Mas mais, a proximidade traz às decisões e às políticas públicas, regionais e nacionais, o relevo de uma determinada comunidade, o potencial económico que a define, os traços que a diferenciam dos restantes concelhos.

Vivemos num tempo em que a globalização e o impacto da inteligência artificial podem pôr em causa a força do local, o relevo das comunidades, a diferenciação das respostas, que se dão no turismo, nas animações culturais, no ordenamento do território, na preservação do património.

E é aos autarcas que se pede e de quem se espera, em primeiro lugar, a defesa das particularidades dos seus concelhos, que os definem e diferenciam. Hoje mais do que ontem, é importante que as cidades e as vilas sejam autênticas, porque também é isso que o visitante quer descobrir. Viver em Ponta Delgada não é o mesmo que viver no Corvo ou em Vila do Porto, mas isso constitui uma riqueza. Todos são relevantes, nesta manta humana que é o nosso arquipélago.

Nas eleições que se aproximam, importa eleger quem melhor protagoniza a força da comunidade local, porque a conhece. Ninguém ama o que não conhece!

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 3 de outubro 2025).

 

Não nascem bebés!

a demografia nos Açores

É um facto, não é uma perceção!

Entre 2021(2043 nascimentos) e 2024 (1871), nasceram menos 172 bebés na R. A. Açores. Face a 2004, são menos 1136 nados-vivos, ou seja, menos 37,8%.

Estes números são um alerta. O índice sintético de fecundidade, ou seja, o número médio de filhos por mulher em idade reprodutiva, nos Açores em 2024 (1,22) está abaixo da média nacional (1,40).

Que políticas públicas visam travar esta redução da natalidade? A medida “Nascer mais”, criada em 2022, tem sido prorrogada, conforme consta da Resolução do GRA (51/2025) de 31 março de 2025. Quais os resultados?

Em 2022, nasceram 2068 bebés nos Açores, em 2024, 1871, ou seja, menos 197. Mesmo assim a verba inicial de 2 milhões de euros, passou para 4 milhões em 2025, para apoiar em 1500 euros, cada criança nascida.

Alguém investigou sobre que motivos levam um casal jovem a ter um primeiro filho ou a equacionar alargar o agregado familiar?

Será que 1500 euros, para aquisição de “bens considerados indispensáveis”, a serem adquiridos em farmácias, motiva os jovens açorianos a serem pais?

Os Açores estão a perder população em idade reprodutiva, sobretudo na faixa etária entre os 20 e os 39 anos (-19,9% entre 2011 e 2021). Estancar essa “sangria” populacional é vital para equacionar o incremento da natalidade na região.

Por isso, é importante saber o que tem feito o GRA para travar a saída destes jovens e, em paralelo, para trazer de volta aqueles que já saíram da região?

Quando a nível nacional as campainhas tocaram o alarme, porque o índice sintético de fecundidade atingiu 1,21 (2013), surgiram estudos e medidas para compreender como seria possível inverter esta tendência. Uma das ações foi reconhecer a necessidade de recuperar alguns dos jovens que haviam emigrado em 2013/14, como pretende o programa “Regressar”. Apesar do programa “se aplicar a cidadãos que tenham emigrado de Portugal” (Resolução do Conselho de Ministros, 2019), os apoios previstos apenas abrangem “os emigrantes ou lusodescendentes que iniciem atividade laboral em Portugal continental.”

E os emigrantes açorianos e madeirenses, que “saíram de Portugal?” Perante esta dúvida, os serviços nacionais competentes respondem que as regiões autónomas têm os seus próprios programas de apoio aos emigrantes regressados? Quais?

Sem uma política de captação de jovens, que saíram da região, por “n” razões, mas que pensam “regressar” às suas ilhas, os Açores estão a perder uma oportunidade de fixar famílias com crianças menores.

Outras medidas se impõem, como as que visem criar condições para manter os imigrantes, que vieram trabalhar para a região e aqui pretendem ficar em família. Estes imigrantes reduzem o défice de mão-de-obra, em diferentes setores, e indiretamente contribuem para o reequilíbrio demográfico das ilhas.

Nenhuma destas medidas, isoladamente, tem efeitos imediatos, mas pode, estruturalmente, criar melhores condições para fixar jovens em idade de planeamento familiar. Estudos nacionais sobre a parentalidade, concluem que não basta “desejar” ter filhos, são necessárias condições de suporte, para concretizar esse projeto parental, nomeadamente, ao nível da ligação das creches e escolas às famílias, do transporte escolar, das atividades extraescolares. Do lado das empresas, é fundamental que haja uma maior responsabilidade social, na flexibilidade de horários, na conciliação trabalho-família.

Sem pessoas, particularmente sem jovens, sem nascimentos, que futuro económico podemos antecipar para as nossas ilhas?

(texto pubicado no jornal Açoriano Oriental de 11 de julho)

 

Santo António casamenteiro

Ó Santo António de Lisboa

Tu que tens fama de casamenteiro

Se o casamento fosse coisa boa

Tu próprio não ficavas solteiro!

 

Em dia de Santo António, há arraiais e festas na Lisboa que o viu nascer. Conhecido por casamenteiro, reza a história que terá ajudado uma jovem que queria casar, mas não tinha dinheiro para o dote. Santo António ficou associado no imaginário popular à defesa dos amores proibidos e dos casamentos, socialmente condenados.

A tradição dos casamentos em dia de Santo António é hoje um cartaz turístico, com direito a transmissão televisiva.

Mas será que o casamento é ainda esse conto de fadas?! 

O casamento mudou, assim nos dizem os números. Se em 2003 foram registados 1541 casamentos nos Açores, já em 2023 só aconteceram 945, ou seja, menos 39%. Desses 945, apenas 252 foram celebrados segundo o rito católico, ou seja, 27,3%. No mesmo período, o número de divórcios (551 em 2003 e 546 em 2023), calculado por 100 casamentos celebrados, passou de 36/100 para 58/100, tornando a Região Autónoma dos Açores a que registou, em 2023, a maior taxa de divorcialidade no país (2,3/1000 contra 1,6/1000 no todo nacional).

Podem as televisões passar a imagem do casamento de “sonho”, de noivas vestidas de branco com ramos de flor de laranjeira na mão, mas a realidade vivida já nada corresponde a essa “fantasia” dos casamentos de Santo António.

As estatísticas mostram um aumento significativo de casais em união de facto. Nos Açores, em 2021, 21000 pessoas viviam sem “papel passado”, particularmente entre os 21 e os 49 anos. E se considerarmos os nascimentos “fora do casamento”, ou seja, em que os pais não estavam formalmente casados no momento do nascimento, representaram 54% do total dos nados-vivos em 2021.

O casamento está a mudar, não é esse conto de fadas, com que terminam muitas histórias de príncipes e princesas e filmes “cor-de-rosa”: “no final casaram e foram felizes para sempre”.

O casamento é um compromisso de partilha de vida, uma associação assente no bem-estar emocional, que melhora a vida de cada um dos seus membros.

Houve tempos em que foi uma “obrigação” de adulto, um dever, sobretudo, para as mulheres que ambicionavam reconhecimento social. Hoje, a realidade mudou, mais de 50% das mulheres em idade ativa estão no mercado de trabalho; muitas prosseguiram estudos e têm hoje carreiras profissionais. A vida familiar continua a ser relevante, enquanto espaço de segurança afetiva, mas tem de ser equilibrada com outros projetos de vida, que também concorrem para a qualidade das relações, conjugal e parental.

Por ser um compromisso, implica respeito mútuo e não é compatível com relações violentas nem sentimentos de posse. No casamento a individualidade tem de ser respeitada. Dizer que o outro é a minha “alma-gémea” ou “cara-metade”, pode mascarar a ausência de um projeto de vida comum, que respeite as duas individualidades.

Ouvi uma jovem dizer, “julgava que com o casamento marcado, acabavam os conflitos”!  Ilusão de quem continua presa à “magia” do ritual, que celebra o compromisso, mas não transforma personalidades ou substitui faltas de diálogo.

O casamento de hoje é mais exigente, envolve a pessoa por inteiro, exige uma construção diária, na descoberta conjunta e no crescimento pessoal.

Nenhum casal deveria somar anos de casamento porque “se atura”, mas porque “se ama” de forma cada vez mais consciente, madura e livre.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 13 junho 2025)

 

Voto do descontentamento

As últimas eleições legislativas deram força ao que muitos designam por “voto de protesto e descontentamento”.

Há cinquenta anos, em Portugal, o protesto estava relacionado com a defesa de direitos, liberdades e condições de vida que o regime anterior negava ao povo. Era dito em surdina e nas entrelinhas das canções ou de textos, ditos revolucionários.

Quem protestava tinha vivido num país silenciado, injustiçado, de onde se emigrava em busca de oportunidades. Poucos tinham a sorte de estudar e muitos trabalhavam sem condições, nem tinham direitos de proteção. Nesse país dos meus avós, as mulheres viviam subjugadas aos maridos, os “chefes de família”, que as podiam violentar, sem que isso fosse crime.

Passaram-se cinquenta anos e voltamos a ouvir falar de “protesto”. Mas, se no passado o protesto reivindicava mais direitos, nas últimas eleições, aparentemente, o protesto visou o Estado que atribui benefícios sociais, supostamente, a quem “não quer trabalhar”. Quem aponta o dedo, julga o outro, seja o imigrante despedido sem direito ao subsídio de desemprego, a jovem mãe com filhos a cargo ou o casal que, apesar de trabalhar, não ganha o suficiente para sustentar os filhos e os pais doentes que vivem com eles. As histórias são muitas e diversas as circunstâncias. Mas para quem julga, do cimo da sua condição, a desconfiança é uma certeza e o julgamento na praça pública é tido como verdadeiro, mesmo que lhe faltem os factos.

Se há cinquenta anos, a sociedade portuguesa protestava por não ter direitos sociais, quando muitos países europeus haviam generalizado o acesso de todos à educação e saúde públicas, há quem agora critique esses serviços do Estado, apesar de ainda estarmos longe da média europeia, na escolarização ou na prevenção de doenças que matam.

É certamente necessário aperfeiçoar e tornar mais eficazes, as muitas respostas que o Estado social proporciona, em situações de doença, incapacidade, velhice, perda ou ausência de rendimentos, desemprego, abandono familiar, violência doméstica e tantas outras, que incapacitam os cidadãos de viver de forma autónoma e digna.

Mas será que a solução passa por desmantelar o Estado social que construímos em cinquenta anos de democracia? Ou não deveríamos antes intervir de forma mais assertiva, acompanhando de forma sistemática os apoios que visam devolver a autonomia aos cidadãos?

Não há democracia sem liberdade, solidariedade e combate às desigualdades.  Pelo contrário, os governos que apostam no individualismo e na autocracia, geram divisões, aumentam os ódios e favorecem os julgamentos primários, que não admitem contraditório, nem têm em conta a realidade dos factos.

Protestar é um direito de cidadania, mas a denúncia inconsequente pode ser perigosa e violenta. Vivemos em democracia há cinquenta anos, mas a sua continuidade continua a depender de nós. Não está construída, nem acabada, é um processo contínuo, vertido em leis e princípios, onde se defende a igualdade de direitos e se luta pelo bem comum.

Será que o protesto que justificou o voto de alguns, nas últimas eleições, visou a defesa do bem-comum? Ou não terá sido um apontar de culpas aos outros, pela sua própria insatisfação e descontentamento? Compreender esse descontentamento deve fazer parte da agenda política e preocupar todas as instituições e movimentos cívicos, que defendem o bem-comum, alicerçado na dignidade de todos e de cada um.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 30 junho 2025).

 

Dia da libertação?

No dia seguinte, ao Dia das Mentiras,  2 de abril, o presidente dos Estados Unidos anunciou o dia da “libertação”, numa declaração proferida no “jardim das rosas” da Casa Branca, um cenário demasiado romântico para um momento tão dramático, como decidir taxar as importações oriundas dos quatro cantos do mundo, com tarifas que vão de 20 a 40%.

Nas palavras do presidente americano, o país está a cobrar aos outros, na mesma moeda, de que é vítima. Ficou mais caro exportar para América, nomeadamente automóveis, queijos ou vinhos. Com isso, espera o presidente, os americanos vão passar a produzir e a consumir esse tipo de bens, “made in América”.

Na sua febre de taxar importações, Donald Trump incluiu os produtos oriundos das ilhas Heard e MacDonald, dois vulcões ativos do território australiano, cujos habitantes são apenas e só, pinguins.

Este “lapso” revela o carácter indiscriminado e autocrático das ordens assinadas pelo presidente dos Estados Unidos, algumas das quais têm vindo a ser revertidas, como aconteceu recentemente no Senado, onde quatro senadores republicanos votaram, ao lado dos democratas, contra a implementação de tarifas impostas ao Canadá.

O impacto destas decisões impensadas, impulsivas e autocráticas, assinadas do punho de um presidente que se faz valer de um quadro de referência de “emergência”, como se a América estivesse em “guerra com o mundo” o que, não sendo verdade, acaba por ter o mesmo impacto, levam à tomada de contraofensivas, por parte dos países afetados pelo agravamento destas taxas.

Não fora esse “quadro de emergência”, Trump não teria poder para decidir desta forma, e estas posições teriam de ser debatidas e votadas no Congresso americano.

O que parece não entrar na equação da administração americana, imbuída de autossuficiência, é que o custo das importações vai ser pago pelos próprios, os consumidores americanos, que verão aumentar o custo de vida.  

O mundo é global e o excesso de protecionismo nunca foi um bem para a economia. Ao mesmo tempo que, supostamente, o governo americano julga estar a promover o consumo interno, gera no resto do mundo um sentimento de rejeição dos produtos oriundos dos Estados Unidos. Mas, infelizmente, se isso pode levar a um aumento do consumo de produtos “made in Europa”, não será suficiente para compensar as exportações para o continente norte-americano, onde aliás residem muitas comunidades de descendentes de países europeus.

Portugal, também será afetado, e neste contexto a Região não ficará imune, sobretudo se considerarmos, os produtos que alimentam o “mercado da saudade”. De acordo com o Serviço Regional de Estatística, com dados de 2024, os Açores exportaram para os Estados Unidos, nesse ano, bens num total de 9 milhões de euros, o que representou 6,2% do total das exportações. Se considerarmos as principais mercadorias exportadas, foram: bebidas alcoólicas (vinhos), madeiras, chá, produtos alimentares e artefactos entre muitos outros.

Trump prometeu, e entende que está a cumprir, o projeto de uma América “grande”. Nas suas palavras, 2 de abril foi dia libertação do gigante americano, do que entende serem as amarras que o prendiam ao resto do mundo.

Infelizmente, esqueceu-se de uma máxima: “ninguém é feliz sozinho!”

O que o isolamento, que a administração americana está impondo aos americanos, está gerando descontentamento e revolta e, tal como um boomerang, vai acabar por trazer efeitos contrários. Alguns querem esperar para ver! Não vá o presidente voltar atrás e, mais uma vez, desdizer-se! Mas, outros entendem que não há tempo a perder, há que reagir, contrapor, mostrar que a democracia ainda é o poder do povo!

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 4 de abril 2025)

Menor esperança média de vida nos Açores

Recentemente, o parlamento açoriano votou uma anteproposta de lei que visa reduzir a idade da reforma nos Açores para 64 anos e dois meses, com o fundamento de que, na região, a esperança média de vida (EMV) à nascença é menor (79,2 anos) do que no todo nacional (81,2 anos). São cerca de três anos a menos, segundo dados do INE para 2024.  Mas, essa diferença não existiria se não fossem os homens açorianos, cuja EMV foi de 74,6 anos, enquanto as mulheres atingiram 81,4 anos. Por curiosidade, a esperança média de vida (HM) nos Estados Unidos da América, em 2022, era apenas de 77,5 anos, quando nos Açores, nesse ano, era de 78 anos (HM).

Retomemos os dados de 2024. Na região, os homens viveram, em média, menos quase sete anos do que as mulheres e isso significa, como aliás vem acontecendo há muitos anos e não só na região, os homens morrem mais cedo. É uma triste evidência estatística.

A questão que importa colocar é saber porquê? Porque morrem os homens mais cedo? Como evitar que tal aconteça? O que fazer para que possamos todos viver mais tempo e viver tempo de qualidade?

Certamente que as causas dessa desigual esperança média de vida não se resolvem antecipando a idade da reforma, “naturalizando” uma desigualdade estrutural, ligada à própria saúde dos açorianos.

Quais as principais causas da mortalidade do sexo masculino nos Açores?

Olhemos, apenas, alguns dados, referentes a 2021 (INE), sobre causas de morte. Os Açores registam uma % maior (27,9) do que a nível nacional (22,1) nas mortes por “tumores malignos”, sobretudo no sexo masculino (32,9%), dez pontos acima das mulheres (22,5%), com particular incidência nos “tumores da traqueia, brônquios e pulmão”. O abuso de álcool, sendo menos relevante, causa cinco vezes mais mortes nos homens açorianos, como também são duas vezes mais frequentes as mortes por “doença pulmonar obstrutiva crónica”. São problemas de saúde graves que, infelizmente, registam maior incidência nos Açores, em particular nos homens.

O que é que a Região faz para reduzir o consumo excessivo do álcool e do tabaco? Que programas estão pensados para a prevenção dos tumores malignos, que mais afetam os homens?

Quais as medidas adotadas para reduzir os acidentes de trabalho, de viação ou mesmo as mortes autoinfligidas que afetam, maioritariamente, a população masculina?

A morte não acontece mais cedo apenas por “fatalidade” ou por se ter nascido nos Açores, é o resultado de um percurso de vida menos saudável, riscos desnecessários, maus hábitos alimentares e falta de exercício físico, que geram doenças crónicas e antecipam o fim, antes de tempo.

As mulheres não estão isentas de problemas. Os dados também revelam que, por viverem mais tempo do que os homens, não significa muitas vezes que vivam com mais qualidade. Mas, as mulheres parecem evidenciar maior necessidade de manter a condição física. Consomem menos tabaco e menos álcool, aderem às caminhadas, frequentam ginásios, seguem programas de promoção do exercício físico em canais de Youtube ou na televisão. E isso faz toda a diferença!

Ao pretender reduzir a idade da reforma, será que Região está a enfrentar as causas da menor esperança média de vida dos açorianos?  Ou não serão antes necessárias ações de prevenção e combate dos problemas de saúde, que condicionam e explicam a menor duração de vida, particularmente dos homens?

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 21 março 2025) 

Entre a Europa e a América

Os Açores estão no meio do atlântico, limite extremo da Europa, de olhos postos na América, que sempre viu como horizonte de sucesso. Até à adesão de Portugal à União Europeia, em 1986, os açorianos ouviam falar mais dos Estados Unidos e do Canadá, do que dos países europeus.

Não podemos esquecer os milhares de açorianos, que saíram das ilhas, sobretudo nas décadas de 60 a 80, e que construíram comunidades inteiras em alguns estados americanos.

No imaginário destas ilhas, ficaram gravadas as histórias de quem emigrou num pequeno barco ou nas asas de um avião, heróis que arriscaram a vida para chegar ao “eldorado” americano.

Entre dois continentes, a Região Açores foi plataforma militar, no tempo da IIª guerra mundial, com relevo especial durante a Guerra Fria. O investimento nas bases militares não visava, propriamente, o desenvolvimento das populações locais, mas a concretização de planos de defesa e controlo do espaço, no quadro da geopolítica e geoestratégia mundiais.

Nos primeiros anos de autonomia democrática dos Açores, o financiamento que decorreu da utilização da base das Lajes teve um peso significativo.

Quando Portugal aderiu à União Europeia, a relação assumiu outros contornos e o reconhecimento das fragilidades das regiões insulares portuguesas, começou a entrar nas prioridades de financiamento. Desde logo, foram transferidas verbas para reforçar a formação profissional, das quais ainda hoje a região depende (o Fundo Social Europeu). Os estudantes açorianos descobriram o programa Erasmus e, desde então, dezenas de jovens, e também professores, têm tido contactado com outras realidades académicas e profissionais. Sabemos todos que estas oportunidades têm por vezes um custo elevado, porque alguns acabam por ir trabalhar nesses países, atraídos pelas oportunidades e o nível de vida.

No domínio ainda do reconhecimento europeu, a região viu reforçados os apoios à agricultura, à pesca e à indústria. Mais recentemente, têm sido disponibilizadas verbas para reforço da sustentabilidade, apostando nas energias alternativas e no combate às alterações climáticas. E, esse é um desafio que a Região pode e deve agarrar, com vista à sua autonomia energética. Imaginemos a ilha das Flores, completamente autónoma ao nível da energia, sem depender do abastecimento de gás ou gasóleo.

O futuro pode ser mais “verde” nos Açores.

Os fundos europeus, dos quais os Açores têm beneficiado nestes últimos quarenta anos, têm promovido uma relação diferente da Região com a Europa, e o facto de hoje integrarmos as denominadas “regiões ultraperiféricas”, não nos diminuiu, antes permite um reconhecimento diferenciado da realidade continental, essa metrópole que já nos designou de “ilhas adjacentes”.

A ligação à Europa está cada vez mais forte e a sua importância é frequentemente recordada, quando os governantes referem “com o apoio do PRR”, um fundo criado após a pandemia para ajudar a (re)erguer os países e as regiões, em termos estruturais.

Somos uma região atlântica, ultraperiférica, onde o “sonho americano” também chegou. Infelizmente, muitos dos emigrantes que o sonharam, enfrentam hoje o risco de “deportação”; por não terem a cidadania americana, são “dispensáveis".

O nosso “coração balanceia” entre o sentimento de sermos europeus, partilhando valores de solidariedade e respeito, e a ligação afetiva com o povo americano, sensíveis aos efeitos das políticas disruptivas da atual administração americana, aparentemente indiferente aos valores europeus, consagrados universalmente na carta dos direitos humanos e na própria constituição dos EUA.

(texto publicado a 7 março no jornal Açoriano Oriental) 

A justiça social não é cega

A imagem de uma mulher vendada simboliza a Justiça, que se quer cega, porque não se deixa tentar por nenhum dos lados do olhar, e imparcial. Do sistema judicial, esperamos a aplicação da lei, independentemente de quem comete o crime, se é pessoa influente e importante ou um cidadão comum. É nessa justiça imparcial que confiamos, ou pelo menos alguns confiam, já que segundo a OCDE (2023), apenas 44,9% dos portugueses referiu confiar nos tribunais, quando a média dos países OCDE, foi 56,9%.

Para falar de Justiça social, temos de retirar a venda! Para se ser socialmente justo é fundamental olhar a realidade, de olhos bem abertos, e reconhecer as desigualdades sociais que estão na origem das situações injustas. Sem considerar essas evidências, não há equidade nas respostas. Podemos achar que a sociedade é justa porque trata todos por igual, mas é exatamente, assim que se gera a injustiça social.

Somos todos cidadãos, iguais perante os direitos humanos e de cidadania, mas não podemos ignorar que vivemos em contextos de vida muito diferentes, confrontados com dificuldades ou impedimentos, devido aos recursos que adquirimos ou que nos proporcionaram, mas também em função das oportunidades que nos foram sendo dadas e do modo como sempre nos trataram.  

A justiça social só é possível, quando reconhecemos que, na realidade, não damos as mesmas oportunidades a todos, seja na escola ou na rua, no emprego ou no parlamento. Não tratamos com dignidade quem é portador de deficiência, dificultando o acesso à educação ou ao mercado de trabalho, limitando ou desvalorizando a sua voz no espaço público.

Até podemos estar de consciência tranquila, porque rotulamos essas pessoas/estudantes de especiais, mas esquecemos que, por serem “especiais”, precisam de ter acesso a determinados recursos para poderem aprender nas escolas; carecem de adaptação de postos de trabalho, para acederem ao mercado de emprego; ausência de barreiras arquitetónicas, para circularem com segurança nos passeios ou acederem a edifícios públicos; carecem de tradutores de língua gestual ou escrita em braile, para comunicarem nos hospitais ou nos tribunais.  

A Justiça social só é possível, quando se reconhece a desigualdade de género, que atravessa os discursos, as práticas, define a divisão de tarefas ou o acesso ao mercado de emprego. Nascem quase tantas mulheres quanto homens, e todos acedem à educação básica. Mas, chegados ao secundário, um terço dos rapazes ficou atrás, no ensino básico, enquanto mais de metade das raparigas prossegue estudos na universidade. Mas, chegadas ao fim da licenciatura, sentem mais dificuldade em ocupar empregos qualificados e quando se enquadram nos quadros superiores, recebem, em média, menos um quinto do salário dos seus colegas do sexo masculino e são uma minoria nos lugares de chefia, alegadamente, por serem ou quererem ser mães, levarem os filhos ou os pais ao médico e não aceitarem horários acrescidos.

A dificuldade em combater a injustiça social está no facto de tratarmos as desigualdades como se fossem “naturais”! Estamos habituados! É “normal”, que um homem chefie, uma criança portadora de deficiência esteja fora da escola, um imigrante aceite trabalhar sem condições, um filho de trabalhador não qualificado não chegue aos bancos da universidade! 

A justiça social constrói uma sociedade mais igual, equitativa e democrática.

A justiça social não é cega, mas alguns sofrem de cegueira social, porque olham sem ver, a realidade desigual e injusta em que vivemos.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 21 de fevereiro 2025)

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