Dia da libertação?
No dia seguinte, ao Dia das Mentiras, 2 de abril, o presidente dos Estados Unidos anunciou o dia da “libertação”, numa declaração proferida no “jardim das rosas” da Casa Branca, um cenário demasiado romântico para um momento tão dramático, como decidir taxar as importações oriundas dos quatro cantos do mundo, com tarifas que vão de 20 a 40%.
Nas palavras do presidente americano, o país está a cobrar aos outros, na mesma moeda, de que é vítima. Ficou mais caro exportar para América, nomeadamente automóveis, queijos ou vinhos. Com isso, espera o presidente, os americanos vão passar a produzir e a consumir esse tipo de bens, “made in América”.
Na sua febre de taxar importações, Donald Trump incluiu os produtos oriundos das ilhas Heard e MacDonald, dois vulcões ativos do território australiano, cujos habitantes são apenas e só, pinguins.
Este “lapso” revela o carácter indiscriminado e autocrático das ordens assinadas pelo presidente dos Estados Unidos, algumas das quais têm vindo a ser revertidas, como aconteceu recentemente no Senado, onde quatro senadores republicanos votaram, ao lado dos democratas, contra a implementação de tarifas impostas ao Canadá.
O impacto destas decisões impensadas, impulsivas e autocráticas, assinadas do punho de um presidente que se faz valer de um quadro de referência de “emergência”, como se a América estivesse em “guerra com o mundo” o que, não sendo verdade, acaba por ter o mesmo impacto, levam à tomada de contraofensivas, por parte dos países afetados pelo agravamento destas taxas.
Não fora esse “quadro de emergência”, Trump não teria poder para decidir desta forma, e estas posições teriam de ser debatidas e votadas no Congresso americano.
O que parece não entrar na equação da administração americana, imbuída de autossuficiência, é que o custo das importações vai ser pago pelos próprios, os consumidores americanos, que verão aumentar o custo de vida.
O mundo é global e o excesso de protecionismo nunca foi um bem para a economia. Ao mesmo tempo que, supostamente, o governo americano julga estar a promover o consumo interno, gera no resto do mundo um sentimento de rejeição dos produtos oriundos dos Estados Unidos. Mas, infelizmente, se isso pode levar a um aumento do consumo de produtos “made in Europa”, não será suficiente para compensar as exportações para o continente norte-americano, onde aliás residem muitas comunidades de descendentes de países europeus.
Portugal, também será afetado, e neste contexto a Região não ficará imune, sobretudo se considerarmos, os produtos que alimentam o “mercado da saudade”. De acordo com o Serviço Regional de Estatística, com dados de 2024, os Açores exportaram para os Estados Unidos, nesse ano, bens num total de 9 milhões de euros, o que representou 6,2% do total das exportações. Se considerarmos as principais mercadorias exportadas, foram: bebidas alcoólicas (vinhos), madeiras, chá, produtos alimentares e artefactos entre muitos outros.
Trump prometeu, e entende que está a cumprir, o projeto de uma América “grande”. Nas suas palavras, 2 de abril foi dia libertação do gigante americano, do que entende serem as amarras que o prendiam ao resto do mundo.
Infelizmente, esqueceu-se de uma máxima: “ninguém é feliz sozinho!”
O que o isolamento, que a administração americana está impondo aos americanos, está gerando descontentamento e revolta e, tal como um boomerang, vai acabar por trazer efeitos contrários. Alguns querem esperar para ver! Não vá o presidente voltar atrás e, mais uma vez, desdizer-se! Mas, outros entendem que não há tempo a perder, há que reagir, contrapor, mostrar que a democracia ainda é o poder do povo!
(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 4 de abril 2025)