Desistir de estudar
Este é sem dúvida um dos maiores problemas sociais e educacionais que tem marcado a realidade portuguesa.
Durante décadas, pouco exigente em relação à qualificação, o País ainda não consegue evitar que grande parte dos jovens desista de estudar antes dos 18 anos e que muitos o façam aos 16. Atingindo a idade limite da escolaridade obrigatória, os jovens e as famílias entendem ter cumprido com o que a sociedade lhes impunha e abandonam o sistema educativo; em alguns casos, fora da escola, as raparigas aguardam um casamento e os rapazes um “serviço”.
“Desistir de estudar” é um problema social que tem merecido a atenção de investigadores, políticos e professores. Segundo alguns autores, há razões sociais e culturais que condicionam as aspirações dos jovens. Por exemplo, terem pais pouco escolarizados, que foram alunos absentistas; viverem em condições materiais desfavoráveis; não valorizarem a escola, como lugar de aprendizagem e formação cívica.
Para além do contexto desfavorável do ponto de vista económico, para muitos, estudar ainda se resume a saber ler, escrever e contar, competências que uma vez adquiridas são consideradas suficientes. O conhecimento do mundo, das ciências, da História ou da Geografia são considerados dispensáveis, pois em nada parecem mudar o quotidiano dessas famílias.
Combater a vontade de desistir, implica alimentar objectivos, projectos de vida que passem pela formação. Porque, para muitos desses absentistas, a escola não é entendida como um lugar onde se aprende a ser e a conviver, um lugar onde se descobrem potencialidades e se interiorizam regras de convivência. Antes pelo contrário, sentem-se rejeitados, marginalizados e, por isso, entendem que não são bem vindos nesse lugar. Está hoje comprovado que as crianças que são socialmente rejeitadas pelos colegas, ou mesmo esquecidas dos professores, têm maior tendência para desistir dos estudos. Porque sentem mais dificuldades na aquisição das competências básicas, porque não se comportam na sala de aula de forma adequada e só quando chega a hora da ginástica ou das expressões plásticas, evidenciam capacidades e obtêm bons resultados, essas crianças e jovens acabam por desistir, face a uma permanente desvalorização do que não são capazes de fazer, sem nunca receberem um elogio e admiração pelas competências reveladas.
Desistir dos estudos não é uma fatalidade para alguns. É uma solução por vezes desejada por um sistema que lida mal com a diversidade de percursos de vida, e que por vezes se esquece dos que ficam na margem, sejam os que têm mais dificuldade ou mesmo os génios, que escapam à média.
Há que analisar as razões que conduzem à limitação dos percursos escolares de muitos estudantes. Refira-se a propósito que na União Europeia a percentagem de jovens entre os 18 e os 24 anos que não está a frequentar o sistema educativo era de 15% em 2006, enquanto que em Portugal esse valor ascendia a 35%.
Na realidade, o problema no nosso País, e em particular na nossa Região, ainda não está ao nível dessa faixa etária, mas antes com os jovens até aos 15 anos. Procura-se evitar que desistam do sistema educativo entre os 16 e os 18 anos, oferecendo-lhes alternativas escolares.
Apesar dessas estratégias, todos temos consciência que a permanência dos jovens no sistema educativo implica que famílias e, sobretudo os mais novos, entendam que aprender é uma necessidade, e que o ser humano só se realiza se cultivar a vontade de querer saber mais. Para além disso, é importante e necessário renovar o clima relacional nas escolas, melhorar a relação dos jovens entre si e com o corpo docente, fomentando o sentido da cooperação, do entre ajuda e da solidariedade, valores que podem fazer da escola um lugar de afirmação de uma cidadania plural.