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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

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Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

Eliminar a violência sobre as mulheres

Quantos não dirão, depois de lerem este título: até parece que os homens também não são vítimas!

Infelizmente, as mulheres ainda pesam muito mais nos números da violência conjugal e nos homicídios que daí advêm. Só este ano, oito mulheres morreram nos Açores às mãos dos seus agressores. Isso não significa que o combate à violência não seja um desiderato universal, que se aplica a todo e qualquer ser humano que seja vítima de maus-tratos.

A violência doméstica, em particular a conjugal, é um problema social grave que carece de prevenção. É importante abordar esta realidade que incomoda, mas que, por estranho que pareça, convive paredes-meias, com o quotidiano de muitas famílias.

Afinal porque ainda são vítimas tantas mulheres?

Desde logo, pela forma como alguns entendem a relação humana, baseada no domínio, na dependência; vivida como espaço de intimidade, reservado, “das portas para dentro” que ninguém parece controlar, mas onde se agride ou humilha, de forma impune.

Quantas mulheres, caladas, silenciam as agressões dos maridos ou companheiros, porque “é ele quem ganha!”. Quantos idosos não calarão humilhações, porque “vivo em casa da minha filha” e tantas outras crianças que perderam o hábito de brincar, porque “a minha mãe precisa de mim”.

No desrespeito pela dignidade do outro, os agressores dominam as vítimas, alternando os actos violentos com pedidos de desculpa, pequenas prendas e promessas de mudança. “Eu não sei o que me passou pela cabeça. Eu não estava em mim. Perdoa-me”. Um ramo de flores ou uma qualquer outra prenda parecem apaziguar uma dor, que aos poucos vai se depositando no interior da mente, instalada como rotina, diluindo a capacidade de reacção.

Humilhadas, magoadas, as mulheres vítimas até chegam a sentir vergonha por pensarem mal do agressor. “Ele até não é má pessoa. Eu gosto dele”. Foi um mau momento. Passado pouco tempo a cena repete-se. Um ataque de ciúme, um controlo excessivo das saídas ou um questionar permanente sobre os gastos, desencadeia uma nova crise de agressividade.

O que fazer? Muitas das vítimas sentem-se sozinhas, receiam pelos filhos ou até pela própria vida e dificilmente falam do seu sofrimento ou pedem ajuda. Afinal, pensam algumas, esta foi a cruz que eu própria escolhi e que tenho de levar até ao fim.

A violência, a agressão gratuita, a humilhação sistemática são sempre sinónimo de perda do respeito, do carinho que devem marcar as relações afectivas nos casais e na vida familiar. Infelizmente, a maioria dos agressores são pessoas próximas das vítimas, que as conhecem e que lidam diariamente com as suas forças e fragilidades. Aproveitam-se desse conhecimento, para espezinhar a sua dignidade, quem sabe para compensar a falta de poder que têm na vida.

Não há justificação para a violência sobre as mulheres. NENHUMA.

O amor não se conjuga com a agressão e o respeito não se pratica com a humilhação.

É obrigação de todos denunciar os maus-tratos infringidos sobre seja quem for. É um dever de cidadania, não apenas porque é de um crime que se trata, mas porque a solidariedade só é uma realidade se for prática de entreajuda. Enfiar a cabeça na areia ou esperar que um dia alguém intervenha pode custar a vida a mais mulheres.

(publicado no Açoriano Oriental de 24 de Novembro 2008)

Um parlamento plural

(17 Novembro 2008) Hoje toma posse a nova Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, agora mais alargada em número de deputados e em forças partidárias. Esta será certamente uma legislatura diferente, onde o debate político ganhará novos contornos, por ventura, maior diversidade de temas e olhares. Com mais forças políticas representadas, as comissões parlamentares serão espaços mais participativos, onde cada força política deverá fazer valer os seus argumentos na leitura dos diplomas em análise.

Quantas vezes, em outras legislaturas, os partidos em maioria na Assembleia sentiam falta de cooperação nas forças da oposição, quando se tratava do trabalho em comissões, quando estas recorriam de forma sistemática ao recurso da “reserva de posição para plenário”. Deixando muitas vezes as propostas de alteração ao partido que apoia o governo, os partidos na oposição procuravam fazer valer a sua argumentação para o debate, fazendo nessa altura uma discussão acalorada, quantas vezes demagógica, com direito a títulos de jornais ou abertura de telejornal.

O parlamento renovado que agora começa a sua actividade irá congregar seis forças partidárias, outros tantos olhares sobre a realidade política da região, o que implicará um conjunto alargado de críticas e propostas. Cada partido terá por isso defender as suas posições com argumentos sólidos, fundamentos credíveis e discursos coerentes, baseados em factos reais e não apenas em visões demagógicas.

O círculo regional de compensação, que alguns críticos julgaram ser uma estratégia de reforço do partido do governo, revelou ser, como o provam os resultados eleitorais, um sistema capaz de valorizar a dimensão pequena das ilhas e o peso relativo dos votos não considerados no sistema eleitoral anterior.

Para um continental, parece absurdo que um deputado possa ser eleito com setenta e cinco votos, como acontece no Corvo. Desconhecem que no quadro de uma Região Autónoma, composta por nove ilhas, todas têm valor idêntico em termos de representatividade simbólica e política.

A identidade dos Açores não é formatada pela maioria dos micaelenses que vivem neste arquipélago, mas pela diversidade insular que, em cada ilha, contribui para a construção do ser açoriano. As centenas de corvinos dão à identidade açoriano o traço que os milhares de micaelenses nunca poderão possuir nem saberão personificar. Por esse facto, cada ilha, desde que há eleições na Região, possui uma cota idêntica de dois deputados, concretizando o princípio de base que as nove ilhas são importantes na construção do arquipélago. A esta realidade se associam os restantes deputados, esses sim, fazendo pesar a realidade dos diferentes núcleos populacionais com impacto diferenciado nos sectores da acção política, desde a educação à economia.

A Assembleia Legislativa não é apenas o órgão máximo da autonomia, é sem dúvida o espelho da açorianidade partilhada por insulares de nove ilhas, expressa em sonoridades de sotaque diferentes, que se unem na defesa dos interesses de uma Região comum.

(publicado no Açoriano Oriental de 17 Novembro 2008)

Sim! Nós podemos.

Yes! We can, foi o slogan emblemático da campanha de Barak Obama, um grito de esperança que mobilizou os americanos e apelou a que acreditassem em si mesmos e votassem na mudança.

Eles podem. E nós? Também podemos.

Este é um apelo à consciência cívica, porque não há mudança sem o contributo de cada um de nós. Não são eles, mas nós! Não são os políticos, os chefes ou os outros, somos nós, sou eu, tu, ele! Nós podemos.

Nós podemos alterar o insucesso escolar, sendo criança ou jovem assumindo a aprendizagem como uma fonte de sabedoria, de crescimento; considerando o conhecimento como uma necessidade; alimentando a curiosidade nas aulas, nos museus, na artes ou num simples passeio vivido em família. Nós podemos se o saber for uma exigência e não uma obrigação.

Nós podemos alterar a vida de sofrimento daquela mulher, vizinha, amiga ou até familiar, que nos confidenciou ser vítima de violência do marido mas que se cala por medo. Podemos ajudá-la a tomar consciência de que tem direito à dignidade, ao respeito; que não é propriedade de ninguém e que são crime as agressões de que é vítima. Nós podemos construir um mundo de paz, se soubermos resolver os conflitos sem recurso à agressão, à humilhação ou à vingança sobre os outros.

Nós podemos alterar a vida dos idosos, se em vida mantivermos os laços de afecto que une pais e filhos, avós e netos. Se estimarmos os seus conselhos e apoiarmos as suas fragilidades. Nós podemos ser melhores profissionais, se trabalharmos em ligação com os outros e se ouvirmos a voz daqueles que dizemos atender, seja em que domínio for. Porque afinal, trabalhar é servir, responder a uma necessidade, e ajudar a construir. Isolados num escritório, indiferentes à opinião dos clientes, discursando numa aula perante alunos a quem raramente se dá a palavra, corremos o risco de viver de forma autista, ignorando a diversidade das vozes que nos cercam.

Sim, nós podemos, se quisermos contribuir para mudar a sociedade em que vivemos. Se julgamos não poder alterar a sociedade, talvez possamos melhorar o ambiente na rua onde moramos ou então na casa a que chamamos lar. Basta ligar o que está desligado, falar com quem julgávamos que não nos poderia ajudar; perguntar o porquê, antes de julgar; pedir ajuda, antes de desatinar.

Sim, nós podemos viver melhor, se formos tolerantes perante a diferença e soubermos dar espaço para que todos possam crescer; se pusermos o bem comum, antes dos interesses pessoais.

Sim, nós podemos, na medida que nos questionarmos sobre o sentido que damos à vida. O que faço pelos outros? Que sentido tem a minha vida? Que exemplo posso eu dar aos mais novos? Que modelos me orientam? O que procuro afinal? Vencer os outros ou conseguir mostrar o que sei e aquilo em que acredito?

Utopia! Dirão alguns leitores. O problema está mesmo aí! Ao atirarmos para o domínio do impossível aquilo em que acreditamos, refugiando-nos na abstenção, no silêncio não comprometido, contribuímos para desligar os laços, isolar os mais fragilizados e fazer coro com os pessimistas.

Sim nós podemos, porque quem acredita pode!

(publicado no Açoriano Oriental de 10 de Novembro 2008)

Num mês sombrio, o sol também brilha

 

Há meses de sol, meses de chuva, meses de frio e outros que apenas são sombrios. Pode o sol brilhar e o povo dizer que o verão regressa por altura do São Martinho, mas nada parece alterar o espírito que marca o mês de Novembro, desde sempre associado ao culto das almas.

As culturas tradicionais utilizam imagens simbólicas para estabelecer a relação espiritual que liga os que partem e os que ficam: o fumo, as cordas, as pontes, o arco-íris, os cruzamentos onde ainda hoje se vêem os azulejos das “alminhas”, são tudo imagens e símbolos utilizados em rituais de culto aos mortos.

No mês das almas, o povo relembra a morte como parte da vida e os mortos como protectores da comunidade dos vivos. Come-se o milho dos mortos, visitam-se os cemitérios e limpam-se as campas; em outros povos, até se fazem refeições nesse local. Relembrar a condição humana, limitada, frágil, efémera, é importante, para melhor se viver.

Afinal, o que faço aqui? Qual é a razão de ser para os dias que me são dados como crédito.

Dizia-me alguém, todos recebemos um depósito diário de 86400 segundos, que podemos utilizar bem ou mal. Mas, se os desperdiçarmos perderemos esse saldo; ficaremos impedidos de gastar o resto do tempo, que não soubemos utilizar em cada dia.

Se queremos enfrentar melhor a morte, que a tantos assusta, fantasma que leva os que mais amamos, temos de encontrar objectivos para investir esse depósito diário de vida, única garantia que permite enfrentar o mês sombrio de Novembro.

Afinal, apesar das nuvens, dentro de cada um de nós há um sol, uma razão para viver. Apesar da morte, que marca as histórias de vida com perdas, que relembra sofrimentos; todos os dias nascem pessoas; à nossa volta há quem sorria quando lhe dizemos bom-dia; há quem espere pela firmeza da nossa persistência para não desistir de viver e de lutar.

Quem não encontra nesse depósito de vida, nesses milhares de segundos uma razão de ser para investir, um tempo para ser, acaba corroído pela solidão, pela preguiça ou pela alienação, e fica entregue a si, contabilizando os segundos que se escapam entre os dedos, entregue ao conselho dessas vozes que dizem: “não vás; não saias de casa; deixa-os fazer; porque te preocupas? Afinal tens 86400 segundos só teus, para que os vais gastar com os outros? deixa-te ficar aí, quieto”. I

lusão de quem julga que a conta da vida aumenta quando a não gastamos.

É nessas horas, quando se desiste de viver, que o medo da morte toma conta e agarra esses avarentos sós, que se lamentam sem nada fazer, que choram o passado, de olhos fechados diante do presente.

Afinal o mês de Novembro, apesar de sombrio, pode ser um mês para festejar a vida, se o culto das almas nos fizer lembrar que quem já partiu cumpriu a sua existência. A cada um resta um tempo, mais ou menos longo para investir. E, se esse tempo for bem empregue, um dia, uma hora ou até um minuto podem fazer a diferença, na minha e na vida de outros.

Afinal, no mês de Novembro, o sol também nasce todos os dias.

(publicado no Açoriano Oriental de 3 de Novembro 2008)

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