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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

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Misses em ponto pequeno

Num dos canais de televisão porcabo, dedicado sobretudo ao entretenimento, há uma série que dá por título “misses em ponto pequeno”, um programa que é anunciado com frequência no intervalo de outras séries.

Considero que a prática que suporta esse programa é, no mínimo, um exemplo acabado do que são maus-tratos sobre crianças.

Maltratar não é apenas bater ou negligenciar na alimentação, nos cuidados de saúde ou na educação. As crianças também são maltratadas quando não têm condições para crescer como crianças.

Maltratar uma criança é impedir que descubra o mundo, à sua maneira, de forma simples, fazendo as perguntas que todas fazem: porque é que as árvores são verdes e o céu azul, como nascem os bebés ou porque é que os meninos são diferentes das meninas?

Maltratar é transformar uma criança num mini-adulto, seja por via dos comportamentos, das obrigações ou da responsabilidade que lhe são exigidos.

“Misses em ponto pequeno” apresenta meninas que participam em concursos de beleza. Meninas entre os três e oito anos, a quem roubam a infância, que são sujeitas ao mundo de fantasia dos seus pais e mães, indiferentes ao dever de respeitar a dignidade e o equilíbrio emocional das suas filhas.

Algumas das imagens, que passam nesses pequenos vídeos de apresentação, são bem o exemplo da violência a que são sujeitas estas “misses” de palmo e meio: esticam-lhes o cabelo em penteados de princesa, com laca e muitos adereços, para a seguir lhes devolver a chucha no intervalo das apresentações; fazem branqueamento de dentes e bronzeados artificiais e entre birras, são treinadas para fazerem um número no dia do concurso, como se fossem amestradas. E depois, é ver essas mães, treinadoras, aos pulos, gesticulando, completamente eufóricas, quando conseguem que a sua pequena “miss” receba a coroa de mais bela.

Maltratar uma criança é roubar-lhe o direito de crescer como criança.

Ser pai ou mãe é um privilégio, uma oportunidade para aprender e descobrir, com os filhos, o mundo que nos rodeia e onde cada um de nós tem um lugar, um projecto para desenvolver. Aos pais cabe o dever de ajudar a crescer, ensinando e aprendendo com os filhos a melhor forma de serem pessoas saudáveis e equilibradas. Essa é a sua principal missão. Uma missão que está consagrada na convenção universal dos direitos da criança.

Os pais que se esquecem desse dever, desrespeitam os direitos das crianças, quando nelas projectam sonhos ou fantasias que não realizaram nas suas vidas, lhes impõem um estilo de vida, sem ter em conta as suas necessidades ou usam e exploram as qualidades dos filhos para alcançarem o seu próprio sucesso.

Numa era onde todos reconhecem que o trabalho infantil é uma violência que impede as crianças de crescerem de forma adequada, não faz sentido que adultos, supostamente responsáveis, destruam a infância de meninas, que ainda dormem de chucha abraçadas a um ursinho de peluche, amestrando as suas capacidades para satisfazer fantasias de adulto.

Como revelam todos os estudos sobre maus-tratos infantis, os agressores são na sua grande maioria os pais biológicos, que se julgam donos dos filhos e se esquece que a paternidade ou a maternidade é uma relação de guarda, não de posse.

“Misses em ponto pequeno” é um triste exemplo de como há adultos que maltratam crianças, usando lantejoulas e penteados, vestidos de baile e saltos altos.

(publicado no Açoriano Oriental, 11 de Julho 2011)

 

Chicotada psicológica

A interrupção de um mandato legítimo de quatro anos e a mudança de governo na República pode ser comparada às chicotadas psicológicas que ocorrem nos clubes desportivos quando, perante uma série de maus resultados, se resolve mudar de treinador a meio da época.

Resta saber se, no caso presente, iremos atingir a dimensão psicológica ou vamos ficar apenas a sentir a chicotada. É que, tal como no desporto, o sucesso de uma mudança nunca depende apenas do novo treinador, mas passa em grande medida pelos jogadores, ou como alguns referem, depende do clima que se vive no balneário, o mesmo é dizer, do espírito de grupo, solidariedade e capacidade de sofrimento de todos em favor
da equipa.

Afinal, o que faltou fazer ao governo anterior? A fazer fé em alguns indicadores, nos últimos anos o país aumentou o volume das suas exportações, melhorou a sua capacidade tecnológica e o número de investigadores e licenciados. Mas essa aposta, fundamental, na competência técnica do tecido empresarial e na investigação não foi suficiente para contrariar o défice estrutural de um país, dependente do exterior, que ainda não acredita o suficiente no que produz e precisa de campanhas que incentivem o consumo do que é nosso. Faltou tempo, para enraizar essa competência e essa crença. Uma equipa que acredita no seu potencial até ganha jogos, quando não recebe salário. E o país, mesmo em dificuldade podia e pode vencer. Mas, o governo anterior falhou, quando tentou diluir a austeridade em sucessivos planos, porventura criando a ideia de que
mentia ao povo, sempre que considerava insuficientes as medidas já apresentadas.

Essa forma errada de lidar com a capacidade de sofrimento dos portugueses custou a queda do governo. O país, entretanto, escolheu outros protagonistas e ficou à espera que lhe aliviassem o peso da empreitada em que se encontra envolvido. Mas não, ao contrário, o que se assiste é o anúncio de medidas ainda mais agressivas e com forte impacto na vida das famílias como é o corte de rendimento equivalente a 50% do subsídio de
Natal.

Afinal, também este governo que criticava os PEC’s, presenteia-nos todos os dias com novas medidas de austeridade, que não constavam desses planos, e que vão para além do que foi acordado com a Troika.

O país precisa de acreditar em si e nas suas capacidades. Mas quando se intervém à chicotada, é difícil estimular o crescimento dessa auto-estima.

Vivemos uma crise profunda, que exige uma intervenção eficaz ao nível da criação de riqueza, mas isso nunca deveria significar esquecer, que o desenvolvimento não é apenas crescimento económico, mas depende de um estado social forte, que respeite os direitos de cidadania e estimule a capacidade empreendedora.

Dificilmente encontramos essa visão, que se quer integrada, no programa do XIXº governo nacional, onde a protecção social é sobretudo uma acção de emergência, e não se reconhece a dimensão estrutural da pobreza. Um texto, onde se prevê privatizar os serviços de informação, transportes, abastecimento de bens essenciais como a energia e as águas, sem considerar a defesa do serviço público. Sem qualquer estratégia sustentável, é exigido “trabalho solidário” aos que auferem subsídio de desemprego, em vez de promover a sua qualificação e a criação de mais postos de trabalho e, claramente, desiste-se de investir nas pessoas menos qualificadas e mais carenciadas, com dificuldades estruturais, atribuindo senhas de alimentos ou de cuidados de saúde.

Tal como numa equipa desportiva, o país não mudará se vender os seus melhores jogadores para manter as contas em dia. É na qualidade da equipa que reside a chave do sucesso.

Não podemos desistir de combater as nossas limitações e carências e de manter a aposta na qualificação, inovação e melhoria das competências dos que vivem em condições sociais desfavoráveis.

Nem só de pão vive o homem, mas da esperança que o motiva a ser mais e melhor.

(publicado no Açoriano Oriental a 4 de Julho 2011)

 

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