A era do turismo
O aumento exponencial de turistas na região tem tido um impacto direto na vida dos insulares. Ficamos todos muito contentes, porque a economia beneficia destes fluxos; há muitos negócios e empregos que se criam. Mas, não podemos ser acríticos e baixar a cabeça, para não ver os efeitos secundários desta vaga, intensa, de visitantes.
Abrimos a porta das nossas ilhas a quem agora nos descobre com entusiasmo, e isso é positivo.
Mas há que estar atento à forma como recebemos, nos inúmeros "AL" (alojamento local), que apareceram como cogumelos nas cidades e nas zonas rurais, e observar a forma como servimos na restauração, por exemplo, com empregados de mesa que não falam, pelo menos, um mínimo de inglês.
É inacreditável ouvir alguém dirigir-se a uma mesa de estrangeiros, dizendo "my colleague, já tomou nota do vosso pedido?" ou usando uma mímica, atabalhoada, para explicar que havia peixe fresco e perguntar o que queriam beber.
O serviço de mesa-bar é objeto de formação profissional e, é importante, que os empresários desta área contratem esses diplomados e valorizem os conhecimentos que lhes foram transmitidos.
Não podemos continuar a dar emprego ocasional, mal pago e precário, a quem precisa de uns trocos no verão, sob pena de termos visitantes que não vão falar de forma positiva da experiência vivida.
Afinal, o que é que temos de melhor?
Sem dúvida que são os nossos produtos, o peixe e a carne, as frutas e os legumes, os temperos e as tradições gastronómicas, simples, mas cheias de sabor.
Destruir esse património, com um mau serviço e falta de rigor na apresentação, é matar a "galinha dos ovos de ouro" que o turismo pode ser para a região.
Não basta ter voos, nem ter hotéis ou mesmo AL, é preciso receber com profissionalismo, manter elevados níveis de higiene, cuidar e criar limites no acesso ou na utilização de recursos naturais.
Ninguém gasta a paisagem por olhar para ela, mas tudo muda quando olhamos o lixo no chão por não haver recipientes por perto, ou triplicamos o número de viaturas, agravando a poluição do ambiente. Já agora, alguém sabe quantas empresas e viaturas de aluguer circulam durante o verão nas ilhas? Que impacto tem esse parque automóvel, junto com o dos residentes, no nosso ambiente?
O turismo pode ser importante para a economia da região, mas há que pensar na sustentabilidade dessa atividade e avaliar as alterações, boas e menos boas, que este sector tem provocado.
A história económica dos Açores conta-se por ciclos/épocas: ao milho seguiu-se a laranja, depois veio a vaca e agora é o turismo. E, de todas as vezes, não soubemos planear e gerir o território, da forma mais adequada. Já não temos produção de milho e os moinhos estão abandonados ou a ser destruídos, por exemplo, para dar lugar a uma via marginal na Ribeira Grande; escasseiam no mercado as laranjas regionais "de umbigo" e só com muita dificuldade se está a sair da monocultura da vaca para uma agricultura, que não seja só pecuária, integrando a horticultura e a fruticultura.
Somos uma terra fértil, um pequeno paraíso onde ainda se pode ver as estrelas no céu, mas temos de cuidar deste frágil ecossistema. De nada vale ganhar muito hoje, se amanhã ficarmos arruinados.
(texto publicado no Açoriano Oriental de 21 de Agosto de 2018)