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SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

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Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

A raiz da pobreza

A pobreza é uma condição, não é castigo ou destino, é o resultado de uma grave situação de carência, incapacidade, falta de recursos ou motivação para lutar. Por vezes é uma herança familiar, outras é a consequência de guerras, conflitos, onde muitos são vítimas de decisões políticas.

A pobreza não se deseja, mas não é fácil desconstruir, tantas e tão variadas são as causas que a explicam.

As estatísticas nacionais dizem-nos que as famílias em maior risco de pobreza são as que agregam dois adultos com três ou mais crianças, 31,6% segundo o Inquérito às Condições de Vida e Rendimento (INE, 2018), seguidas das famílias com um adulto com, pelo menos, uma criança, 28,2%. Infelizmente não existem dados regionais que permitam tipificar as famílias em risco de pobreza nos Açores, mas sabemos que atinge 31,4% dos residentes, segundo o mesmo Inquérito.

No entanto, se considerarmos as famílias que beneficiam do Rendimento Social de Inserção (RSI), então veremos que os baixos salários ou o desemprego, aliados a outras faltas de recursos enraízam famílias, mais numerosas ou monoparentais, num emaranhado de dificuldades estruturais. Que fatores justificam essas dificuldades?

A pobreza enraíza-se quando o salário mínimo não chega para fazer face às necessidades de uma família com crianças pequenas; mas também se enraíza quando os apoios sociais somados são superiores ao salário mínimo, gerando dependência e reduzindo a autonomia e a capacidade de esforço.

A pobreza enraíza-se em famílias onde as mulheres são vítimas de violência, sujeitas a uma sobrecarga de trabalhos, cuidadoras de doentes e idosos, de filhos portadores de deficiência, incapazes de se autonomizarem por via de um emprego, quantas vezes enfrentando sozinhas todos esses problemas.

A pobreza enraíza-se quando a escola fica distante da motivação e do interesse, das expectativas e das estratégias de longo prazo, porque os pais vivem o dia a dia, incapazes de ver no estudo uma forma de libertação dos constrangimentos e das dificuldades. A pobreza também ganha mais força quando, apesar das dificuldades, se incentiva os filhos a estudar mas, porque se vive com pouco mais do que o salário mínimo, se perde o direito à bolsa ou aos apoios da ação social escolar.

A pobreza arrasta para a dependência aqueles que se afundam diariamente no álcool ou na droga, comprometendo os recursos familiares, a esperança dos pais ou até dos avós, incapazes de lidar com a adição doentia dos jovens.

A pobreza corrói a vontade, a motivação e mata a esperança quando, em vez de um emprego as portas se abrem apenas para experiências de formação ou ocupação, quantas vezes distantes das competências acumuladas ao longo de uma vida.

Lutar contra a pobreza é o desafio de todos os tempos, que tem inspirado o mundo a delinear medidas. Primeiro foram as metas do Millenium que deveriam ter sido concretizadas até 2015. Agora são os Objetivos para um Desenvolvimento Sustentável que o mundo se propõe concretizar até 2030.

Apesar dos avanços, a luta contra a pobreza e a exclusão social continua a mover governos e associações, porque não basta mudar as aparências, da fome ou da falta de higiene. É preciso arrancar as razões que enraízam a pobreza e a reproduzem através gerações.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 22 janeiro 2019)

 

As Sufragistas

Nem sempre a História soube reconhecer o mérito de quem lutou, com a própria vida, para que outros tivessem direitos consagrados em lei, particularmente, quando essas lutas foram e são protagonizadas por mulheres.

Recordo ouvir dizer "tem um ar sufragista", para rotular uma mulher que punha em causa o estereótipo da esposa submissa, dedicada aos outros, que se apaga para que a família tenha conforto e comida na mesa.

Longe dessa imagem de mulher fria e distante, as sufragistas recordam uma página da história europeia, de luta por um estado de direito, com base no sufrágio universal, prenúncio de muitas outras reivindicações, em diferentes países, por sociedades mais igualitárias e justas.

Infelizmente, a luta pela igualdade de género continua a fazer sentido no séc. XXI, quando governos, como no Brasil, pretendem combater a "ideologia de género" e pintar o país de azul e cor de rosa, o mesmo é dizer, institucionalizar a separação de papéis, funções e direitos em função do sexo.

Nunca é demais recordar que a igualdade de género é uma face da democracia. Não se trata de reivindicar direitos para as mulheres, mas alterar a relação entre homens e mulheres, seja no mundo da casa ou do trabalho, da política ou das profissões, denunciando a desigualdade de poder, a violência ou a exploração.

Mas porque é tão difícil afirmar a democracia?

A história das mulheres que lutaram, nas primeiras décadas do século XX, pelo sufrágio universal é bem demonstrativo dessa dificuldade*.

Não se trata apenas de mudar a lei, mas de transformar a própria estrutura da sociedade, formas de pensar, significados associados ao que é ser homem ou mulher, papéis atribuídos, tarefas tidas por serem próprias do feminino ou do masculino, inculcadas no pensamento e no comportamento desde a infância, condicionando escolhas, limitando relações e, sobretudo, formatando o exercício do poder.

Falar de igualdade de género, não é apenas, pretender mudar a sociedade, mas transformar a sua forma de pensar. Não se trata de defender uma minoria que, na realidade não existe, já que o mundo se divide em partes, quase iguais, de homens e mulheres. Mas fazer um exercício de democracia, enquanto partilha de opiniões, construção de soluções na partilha do poder, diálogo e reconhecimento da diferença.

Sem extremismos, estão em causa direitos humanos e o reconhecimento de que o mundo é melhor quando todos temos acesso à palavra e podemos, em cooperação, construir uma sociedade mais justa e livre.

Porque é de liberdade que se trata.

Se a igualdade de género é uma face da democracia, sem sombra de dúvida que é, também, uma expressão da liberdade de ser, estar e participar.

Num mundo cada vez mais global, onde as tecnologias da comunicação abrem estradas de descoberta, nascer mulher não deveria ser uma condenação, como infelizmente ainda acontece, quando as mulheres são reduzidas à sua função reprodutiva, objeto de exploração ou discriminação.

A luta pelo sufrágio universal marcou o século XX, mas outros desafios se colocam no século XXI, em defesa da dignidade e de uma sociedade plural.

(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 8 janeiro 2019)

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