Mulheres
São 50% da população mundial e 52,7% dos portugueses mas, por vezes, são tratadas como se fossem uma "minoria", desvalorizadas e injustamente remuneradas, realidade demonstrada em diferentes estudos sobre igualdade de género. A Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) acaba de divulgar mais um, "As mulheres em Portugal, hoje", coordenado por Laura Sagnier, cujos resultados revelam algumas das contradições que estruturam a vida das mulheres portuguesas, particularmente as que tem entre 18 e 64 anos e vivem numa relação conjugal.
Uma primeira contradição é revelada quando se cruza a resposta das mulheres à questão sobre qual a faceta da vida que mais lhes traz felicidade? Apesar de, a grande maioria referir os filhos como a principal fonte de felicidade, quando se analisam todas as facetas da vida (emprego, casa e família) a correlação faz-se com o parceiro. É este quem exerce mais influência no sentimento de felicidade ou infelicidade que sentem.
Como explicar esta contradição?
Na realidade, com estas respostas, as mulheres revelam que, se por um lado, os filhos são uma fonte inesgotável de felicidade, elas precisam de uma relação de companheirismo, alguém com quem possam dividir dificuldades e alegrias do quotidiano, para poderem se sentir totalmente felizes.
Assim, o sentimento de infelicidade aumenta sempre que a mulher não tem um companheiro com quem possa dividir as tarefas domésticas, alguém que a oiça, que lhe dedique o máximo do tempo disponível e seja carinhoso e atencioso. E esse desejo feminino decorre do facto de, dois terços das tarefas domésticas e dos cuidados aos filhos menores serem assegurados pelas mulheres. Seja a cozinhar ou a lavar roupa, a ajudar nos trabalhos escolares ou a ir ao médico com os filhos doentes, as mulheres asseguram essas tarefas três vezes mais do que os seus companheiros. Exceções há mas, até nesses casos, há homens que preferem dizer que vão levar o carro ao mecânico só para que o chefe e os colegas não lhe digam: "não tens a tua mulher para tratar disso?".
Uma segunda contradição que este estudo revela situa-se ao nível do mundo do trabalho e da desigualdade que, infelizmente, ainda marca os rendimentos de homens e mulheres em Portugal. Ao contrário da realidade europeia, em Portugal as mulheres, na sua grande maioria, trabalham a tempo inteiro e, como vimos, ainda asseguram um conjunto de tarefas não pagas, quando regressam a casa.
Apesar de cada vez mais escolarizadas, ganham em média menos 15 a 20% do que os seus colegas homens e, no estudo da FFMS, 43% das mulheres recebem menos do que os seus companheiros. Mas, pasme-se, quando se trata das despesas familiares, contribuem com 50% dos gastos, parte do seu salário vai para a dispensa, a roupa dos filhos ou o material escolar. Tem pouco tempo para si próprias e poucos recursos.
De acordo com o estudo, poder conciliar a vida familiar com o emprego traria felicidade a muitas das mulheres/mães que trabalham.
Mas será esta é uma questão feminina? Não seria mais fácil se a construção da felicidade fosse feita a quatro mãos e, na casa como no emprego, houvesse espaço e tempo para que cada um/a se sentisse feliz?
Já agora, o que pensam e sentem as mulheres açorianas, hoje? Talvez fosse tempo de estudar 50,7% dos residentes nesta região.
(artigo publicado no Açoriano Oriental de 19 Fevereiro 2019)