Honrar a promessa feita
Este é o tempo das promessas, uma palavra de duplo sentido. Primeiro, como micaelenses, associamos à imagem das procissões, onde centenas de pessoas levam círios ou simplesmente caminham rezando.
Ali vão "as promessas"! Aquelas pessoas estão "pagando" uma promessa, dizem! Pediram uma graça, num momento de aflição e, agora, vão descalços, levando o peso de uma criança ou, simplesmente, vestindo preto e rezando, como forma de ação de graças.
Um outro sentido para "promessas" é aquele que anima todas as campanhas eleitorais. E, neste momento, a Europa vive mergulhada em discursos partidários que visam captar eleitores, procurando cada candidato, à sua maneira, convencer os indecisos e converter os outros para que acreditem nas suas palavras, nos propósitos que prometem cumprir, se forem eleitos.
Promessas, do verbo prometer, são por isso anúncios, boas intensões, que preanunciam mudanças, ou assim deveria ser.
Uma promessa, mesmo aquela que se faz na relação com o divino, no meio de um momento de aflição, deveria implicar uma revisão de vida, uma alteração de hábitos ou o reatar de uma relação, que entretanto se perdeu, por conflitos não resolvidos.
A promessa, até pode ser paga, cumprida, mas na prática só transforma a vida dos indivíduos ou das comunidades, quando compromete, ou seja, envolve a pessoa, o crente ou o político, a família ou a comunidade, o partido ou a organização.
E comprometer é muito mais do que prometer.
Comprometer significa estar disposto a mudar, a lutar contra as dificuldades que as mudanças exigem e transformar a realidade, a sua vida ou a vida dos outros. Por isso, o compromisso é um ato de honra, de responsabilidade, que implica aquele que se compromete.
Se, por um lado, as promessas podem parecer palavras bonitas, frases feitas, pensadas para agradar, verdadeiros iscos, que mais não fazem do que negociar favores, por outro, os compromissos são contratos, que criam expectativas reais e que, não sendo cumpridos, trazem consequências. Um compromisso não cumprido pode destruir uma relação, enquanto uma promessa, que se esfuma no tempo, acaba esquecida e desvalorizada.
Talvez por isso, vivemos num tempo onde é mais fácil alguém prometer do que se comprometer. Eu prometo que vou tentar, mas não me comprometo em conseguir!
Eu prometo viver contigo, mas não me comprometo que dure para sempre!
Eu prometo defender a tua causa, mas não me comprometo em dar solução ao teu problema!
Não se comprometer é, em muitas situações, uma expressão do individualismo que grassa na nossa sociedade, que não cria laços duradoiros, nem implica as vidas das pessoas nas soluções. É cada vez mais fácil rasgar promessas, muitas até feitas em ocasiões solenes, envoltas em rituais, com juras e juramentos, mas que, não comprometeram quem as proferiu.
Só quando as promessas se transformam em compromissos, se pode aumentar e reforçar a confiança. E isso tem sido evidente no nosso país e até na Europa, onde os índices de confiança nas instituições políticas são, normalmente, baixos.
Conjugar o verbo comprometer implica o prefixo "se", que envolve os atores no compromisso, "eu me comprometo". Prometer, promessas, podem ser apenas palavras.
Comprometer implica honrar a promessa feita.
(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 14 maio 2019)