Deixe a ilha como encontrou
São Miguel está inundada de veículos de aluguer. Mais carros, mais visitantes, mas também maior contribuição para o nível de poluição atmosférica.
Numa região de 246 mil habitantes, o parque automóvel tem crescido todos os anos, muito por conta das viaturas de rent-a-car, de matrícula recente. De acordo com as estatísticas oficiais (Direção Regional dos Transportes), em 2017 circulavam nas estradas açorianas 147 mil automóveis e a Região Autónoma dos Açores era a terceira região do país com o melhor parque automóvel (menos de 10 anos).
O que acontece depois a todos esses automóveis? Para já, ocupam os poucos lugares de estacionamento, invadem pontos turísticos e, depois, muitos acabarão em parques de viaturas de segunda mão!
Este é um problema real, com o qual todos nos devíamos preocupar. Qual o contributo que a região Açores, no seu todo e em particular nas ilhas onde cresce o uso de viaturas automóveis, está a dar para as emissões de CO2?
Apostar num melhor transporte público é necessário e urgente. Um transporte que sirva zonas turísticas, reduza o uso de viaturas ligeiras em determinados locais e, sobretudo, tenha em conta o limite máximo de veículos que este território comporta.
Para quem está atento, de certo já se deu conta da proliferação de empresas de rent-a-car, umas com chancela nacional ou internacional, outras de iniciativa local, com nomes sugestivos que apelam à magia das ilhas ou ao espírito de aventura, indiferentes à pegada ambiental que representam.
Todos os visitantes são bem vindos! Certamente! O turismo é uma nova e importante fonte de receita para a economia açoriana. Mas, os açorianos não são paisagem, indiferentes a esta ocupação excessiva do seu território ou às inúmeras situações de infração das regras básicas do código da estrada, protagonizadas por viaturas de aluguer.
Dei-me ao trabalho de pesquisar se o código de estrada valia apenas para os nacionais. Não! Portugal é signatário de convenções internacionais que uniformizam regras de condução, nomeadamente os sinais de trânsito. Então, como se justifica tanta infração? Tem se visto de tudo. Inversões de marcha em zonas interditas, passagens no vermelho, como se os semáforos não estivessem lá, desrespeito pelo traço contínuo na estrada, condução em contramão e estacionamento caótico.
Ninguém pode alegar que no seu país é assim que se faz!
Os sinais de trânsito estão convencionados e, felizmente, hoje existe o GPS e outras aplicações que ajudam na circulação, apesar de nem todos esses mapas referirem o sentido das ruas. Aí, só mesmo a atenção do condutor e o conhecimento das regras mínimas de trânsito podem valer.
As empresas de aluguer de viaturas talvez devessem alertar, informar, sobretudo, quem vem de países onde os semáforos se localizam longe da via e não é infração grave fazer uma inversão de marcha em cima de traços contínuos, como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos ou no Reino Unido.
"Deixe a natureza como a encontrou", é o lema do turismo sustentável. Mas, se destruirmos, todos os dias, o ar que respiramos, a qualidade da água que bebemos, os locais que visitamos, não tarda muito e o que deixarmos será uma amostra do que recebemos.
(texto publicado no jornal Açoriano Oriental de 20 agosto 2019)