Oh heroína cidade!
O tema das Sanjoaninas de 2018 foi o liberalismo e o papel de Angra do Heroísmo na História de Portugal. Uma página da história interpretada por algumas das marchas que desfilaram pela Sé, ao som de palmas entusiastas.
A Marcha dos Coriscos, fiel ao tema proposto, contagiou a assistência com este refrão: "Oh heroína cidade, foste capital da nação! Lutaste pela liberdade, Rochedo de salvação!; Rochedo de Salvação, nas lutas da realeza; venceste com o coração, foste Ilha Fortaleza."
A história tem de ser vivida, se não, é esquecida. Alguns talvez não saibam porque foi construído o obelisco da Memória, que se ergue no alto da cidade de Angra?
Este é um símbolo das lutas liberais e da vitória sobre o Absolutismo, que valeu a Angra o nome de Heroísmo.
Dar sentido ao património, material e imaterial, é fundamental para as gerações mais jovens aprenderem a conhecer o povo a que pertencem e os valores pelos quais lutou no passado. Valores que, ainda hoje, nos movem, como é o caso da liberdade.
Viver em liberdade nunca é uma dádiva ou uma garantia mas, será sempre uma conquista perante poderes absolutos, líderes ditadores ou indivíduos autocratas.
Nada está garantido, nem nada é gratuito, quando se trata da defesa de princípios.
Por isso, é importante relembrar a história, que se esconde em edifícios, documentos e na vida de personagens, muitos dos quais dão nome às ruas por onde passamos.
O pior que podemos fazer a esse legado histórico é ignorar, enterrar ou desvalorizar, como se tudo pudesse começar do zero, a cada geração que passa.
Fazer memória, do percurso histórico de um povo, é aprender com o passado a dar sentido ao futuro, que vamos construindo no presente.
As Sanjoaninas apelam a esse exercício, de cada vez que escolhem uma página de história para tema das festas, misturando conhecimento com alegria, trazendo a seriedade do passado para a folia do presente.
Precisamos desta alegria que se fundamenta na identidade histórica e cultural que nos molda como povo.
As Sanjoaninas são festas terceirenses, mas porque apelam ao sentimento, promovem a alegria e entusiasmam quem nelas participa, transformam-se em festas açorianas, onde todos se sentem desejados e acolhidos.
Há nove anos que a Marcha dos Coriscos participa nestas festas e são um exemplo de como a alegria não é património de nenhuma ilha ou comunidade. É muito fácil acabar com bairrismos ou divisões entre ilhas, quando respeitamos a cultura de cada uma e descobrimos que a união das diferenças nos torna mais ricos.
A história nunca deve dividir, mas antes fazer memória do que é um povo.
Só ligados pelo afeto, conseguimos transformar as tradições, que nos distinguem, em património comum e perceber que a açorianidade não vem no sangue. Antes é um sentimento que se cultiva na descoberta da diversidade das ilhas, uma ligação que nos aproxima e une, feita de diferentes sotaques e sabores, tecida de eventos e emoções, que nos torna irmãos e faz partilhar uma terra que nos serve de berço e sepultura.
Faz falta falar e ensinar sobre a história dos Açores! E, nada melhor do que aprender em ambiente de festa.
(texto publicado no Açoriano Oriental de 27 junho 2018)