Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

SentirAilha

Viva! Este é um espaço de encontro, interconhecimento e partilha. Sentir a ilha que cada um é, no mar de liberdade que todos une e separa... Piedade Lalanda

Enfermeiras e o combate à mortalidade infantil

31 de Dezembro 1955, uma data como outra qualquer, mas que marcou a vida de quinze jovens enfermeiras que deram corpo ao primeiro grupo de profissionais que instalou em São Miguel e Santa Maria, o Plano Materno Infantil. E porquê? Porque nos Açores, à data, morriam 157 bebés, em cada mil que nasciam, antes do 1º ano de vida. Éramos a região de Portugal onde morriam mais recém-nascidos, os “anjinhos” que ficaram na história de muitas famílias. Hoje esta é uma realidade ultrapassada e os Açores eram mesmo uma das regiões com a mais baixa taxa de mortalidade infantil em 2021, 2,4/1000 nascimentos.

Entre essas primeiras jovens enfermeiras, que chegaram a São Miguel a 31 de Dezembro de 1955, estava Maria Eduarda Santos Cordeiro. Quando lhe propuseram a escolha de um concelho de São Miguel para trabalhar, não conhecia as ilhas, mas preferia um concelho rural. E, com apenas vinte e um anos, foi colocada no Nordeste. Como ela própria recorda, ninguém imagina como era difícil fazer o trajeto de carro entre Ponta Delgada e o extremo oeste da ilha, por caminhos que se enlameavam no inverno e se enchiam de pó no verão.

A história da Saúde nos Açores muito deve a estas enfermeiras, que conseguiram contribuir para a redução da mortalidade infantil, cuidando das populações, em particular das grávidas e crianças, em concelhos isolados e onde nascer era um momento de risco. Não raras vezes eram chamadas, altas horas da noite, para atender um bebé com febre alta ou uma grávida que pressentia a hora de dar à luz. Estas enfermeiras faziam muito mais do que cuidar das famílias, ensinavam-lhes princípios básicos de saúde, desde a alimentação à higiene.

Foi com a implementação do Programa Materno-infantil que nasceram os “dispensários”, hoje centros de saúde concelhios, protagonizando uma mudança estrutural na prestação de cuidados de saúde na Região. 

Na sequência da implementação deste Programa, nasceu a Escola de Enfermagem de Ponta Delgada em 1957, para fazer face à necessidade de recursos humanos que pudessem dar continuidade ao projeto de mudança, que aproximou a Enfermagem das comunidades locais. Antes mesmo de existir Universidade, Ponta Delgada já contava com esta Escola onde, desde o início, se era exigente na formação técnica, profissional e humana.

Montar uma escola do zero foi, sem dúvida, uma empreitada arrojada e exigente, que teve a Enfermeira Santos Cordeiro como diretora, durante três décadas. Começou essa missão com apenas 22/23 anos, mas sempre lutou pelo lugar que era devido à enfermagem, uma área de saber e de prática profissional que muitos subalternizavam perante o poder médico.

Passados 65 anos, a Escola de Enfermagem, hoje Escola Superior de Saúde, teve a honra de assistir, no passado dia 30 de novembro, com toda a comunidade académica da Universidade dos Açores, ao doutoramento honoris causa que reconheceu o percurso de vida, profissional e cívico, da Enfermeira Santos Cordeiro Lalanda Gonçalves.

Ontem como hoje, a saúde nos Açores muito deve ao trabalho dos enfermeiros e das enfermeiras que, nos hospitais e centros de saúde, promovem a saúde, tratam os doentes e cuidam dos açorianos.

Ainda está por escrever a história da saúde nos Açores, uma região periférica que soube descentralizar os cuidados a todas as ilhas e, mesmo com todas as dificuldades e limitações, tem hoje um sistema público de saúde que cuida de todos os açorianos, de Santa Maria ao Corvo.

 

Fazendo pontes

O programa "Bridging the Atlantic" liga as duas margens, da América e dos Açores, num intercâmbio de experiências e vivências que, desde há cinco anos, já envolveu mais de uma centena de estudantes de enfermagem.

O Bridging tem recebido apoio do Governo Regional dos Açores e da DeMello Charitable Foundation, nos EUA. Envolve a Escola Superior de Saúde da Universidade dos Açores e o College of Nursing da Universidade de Dartmouth em Massassuchets. Os estudantes, das duas instituições, aprendem a conhecer o sistema de saúde de cada país e descobrem a importância da diversidade cultural para uma prestação de cuidados de saúde, de qualidade.

Este não é apenas um programa de intercâmbio, mas uma oportunidade de descobrir como se pode qualificar o cuidar, em enfermagem, apesar de nem sempre existirem os recursos ideais. O ser humano quando adoece, onde quer que esteja, precisa sempre de alguém que cuide, não apenas do corpo, mas entenda a linguagem da mente, o sentir da alma e acolha a sua história pessoal.

E, sem dúvida, quando um estudante de enfermagem tem a oportunidade de vivenciar uma experiência em outros contextos culturais, percebe o quão importante é saber comunicar com a pessoa fragilizada e fazer com que recupere as forças do corpo e da mente, agarre a vida e lute contra a doença ou a dificuldade.

Entre os profissionais de saúde, a trabalhar nos Estados Unidos, há descendentes de açorianos. Pertencem a uma nova geração que teve oportunidade de estudar, mas muito devem aos avós e pais que desafiaram a sorte, no dia em que emigraram e procuraram trabalho em fábricas, sobretudo na zona leste, em Massassuchets.

Não é de estranhar que tenha sido aí, junto ao mar, que a comunidade de açorianos cresceu nos Estados Unidos. Vendo o horizonte, imaginando as ilhas do outro lado, ganhou raízes à custa de muito e árduo trabalho e dos filhos, que entretanto nasceram.

Ainda hoje, alguns emigrantes dessa primeira geração, não sabem falar inglês. Para trabalhar, catorze horas por dia, não era necessário. Depois, viviam entre compatriotas, em casas de três pisos, junto de quem lhes tinha enviado a "carta de chamada", irmãos ou pais, mantendo vivas as tradições e o tempero da comida.

Nem tudo foram rosas e, ainda hoje, nem todos vivem sem dificuldades. Ninguém gosta de falar de insucesso, da solidão dos idosos ou dos problemas de quem não tem emprego, documentos e que, por vezes, é apanhado pelas malhas da justiça. Não se julgue que a vida corre de feição para todos. Há quem lute diariamente para conseguir pagar as contas no fim do mês.

Outros, apesar da tranquilidade financeira, continuam sonhando com o regresso à ilha. "Minha rica terra! É na minha terra que eu respiro melhor!"

Lá como cá, a vida dos açorianos mistura sucesso com necessidades, alegrias com sofrimento. O importante é que cada um, na sua área, contribua para, não apenas dar, mas ser resposta a essas necessidades e sofrimentos.

Entre as duas margens do atlântico, os estudantes de Enfermagem, da Escola Superior de Saúde, através do programa Bridging the Atlantic, constroem pontes de cooperação, aprendem a trabalhar em equipa bilingue e dão provas de como o ensino que recebem, em particular, na Universidade dos Açores, os prepara para serem enfermeiros do mundo.

(artigo publicado no jornal Açoriano Oriental a 30 abril 2019)

Mais sobre mim

imagem de perfil

Visitantes

Arquivo

  1. 2024
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2023
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2022
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2021
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2020
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2019
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2018
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2017
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2016
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2015
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2014
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2013
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2012
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2011
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2010
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2009
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2008
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D
  222. 2007
  223. J
  224. F
  225. M
  226. A
  227. M
  228. J
  229. J
  230. A
  231. S
  232. O
  233. N
  234. D